A ascensão do Senhor

Dom Aloísio A. Dilli – Bispo de Santa Cruz do Sul

Continuamos a celebrar na liturgia da Igreja o Tempo pascal, que se prolonga por 50 dias, até a solenidade de Pentecostes. Antes da vinda do Espírito Santo, Jesus subiu aos céus, mistério que celebramos na solenidade chamada Ascensão do Senhor. Os textos bíblicos que relatam este fato, ocorrido 40 dias depois da ressurreição, estão intimamente relacionados com a missão dos discípulos de continuar o anúncio da Boa Nova de Jesus, contando sempre com a companhia do próprio Senhor (Cf. Mc 16, 19-20; At 1, 8-11).

Para compreendermos o sentido teológico-litúrgico da solenidade da Ascensão do Senhor é preciso ir muito além de uma imaginação cênica da subida do Senhor entre as nuvens e voltando aos céus. O que os escritores sagrados quiseram transmitir às comunidades cristãs com esta linguagem cheia de simbolismo? Em primeiro lugar convém fazer uma relação da Ascensão com a Encarnação (nascimento – natal) de Jesus Cristo. Na linguagem litúrgico-celebrativa de ambas (Oração sobre as Oferendas) encontramos a expressão: “troca ou comunhão de dons entre o céu e a terra”. Na reflexão teológica dos autores está a intenção de revelar um Deus misericórdia, de atitude samaritana, que desce ao encontro da pessoa humana, sua criatura e objeto de seu amor infinito. Esse verbo descer (ser servo: lava-pés) tenta mostrar como a iniciativa de Deus coloca seu coração junto à miséria humana (miséria + coração = misericórdia) para redimi-la e renovar a aliança rompida: é o encontro do divino com o humano (encarnação) para que este possa entrar em comunhão com a divindade. Deus oferece a divindade e nós, a humanidade.

Qual é então o sentido da Ascensão do Senhor? O mesmo Jesus, o “Verbo que se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1, 14), que desceu do seio da Trindade ao nosso encontro, agora, na Ascensão, toma o movimento inverso: sobe aos céus, elevando junto com ele nossa humanidade. Por isso exulta e louva o Prefácio I da Ascensão: “Ele, nossa cabeça e princípio, subiu aos céus, não para afastar-se de nossa humildade, mas para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade” e o Prefácio II completa: “Ele, após a Ressurreição, apareceu aos discípulos e, à vista deles, subiu aos céus, a fim de nos tornar participantes da sua divindade”. Por isso a Igreja reza: “Ó Deus todo-poderoso, a ascensão do vosso Filho já é nossa vitória. Fazei-nos exultar de alegria e fervorosa ação de graças, pois, membros de seu corpo, somos chamados na esperança a participar da sua glória” (Oração do Dia).

Os textos litúrgicos da Ascensão revelam uma teologia que aponta para o valor extraordinário da nossa vida: fomos criados para sermos eternos. Lembra o Prefácio III do Natal: “No momento em que vosso Filho assume nossa fraqueza, a natureza humana recebe uma incomparável dignidade: ao tornar-se um de nós, nós nos tornamos eternos”. A Igreja celebra a Ascensão do Senhor com alegria, pois Jesus Cristo, à direita do Pai, já representa nossa humanidade. Na esperança, já participamos de sua glória. A Igreja une-se ao Senhor que permanece conosco até o fim dos tempos e está também nos céus, não se afastando de nossa humanidade, mas elevando-a para junto do Pai, tornando-se Mediador e atraindo-nos para a realidade celestial.

 

 

 

 

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