Bendita Maria
Maria de Nazaré, Mãe de Jesus, representa uma revolução silenciosa e profunda na história das mulheres. Vivendo em uma sociedade onde o poder masculino era absoluto e as obrigações femininas impostas com rigor, Maria se manifesta como um símbolo de autonomia e liberdade. Sua força não está na oposição direta, mas na unidade interior que a faz profetisa da igualdade e dignidade entre homens e mulheres.
Num contexto machista, onde o amor erótico era reduzido ao satisfazer os homens, Maria opta por um amor maior: o ágape, uma entrega total a Deus. Ela desafia não apenas as normas do seu tempo, mas o julgamento masculino que condenava mulheres ao apedrejamento. Seu “sim” ao anjo Gabriel não é ingênuo, mas um ato de coragem. Ela conhece os riscos caso seu noivo não a acolhesse com seu filho, e mesmo assim, confia plenamente no projeto divino. Sua liberdade não se opõe à condição de serva do Senhor, mas a fortalece. Maria é a mulher que arrisca tudo pelo chamado de Deus.
Este vínculo de Maria com Deus não se limita ao espiritual; abrange todo o seu ser e agir. Ela não está confinada a uma dimensão meramente religiosa, mas integra todas as dimensões de sua vida para realizar a vontade do Pai. Ela realiza de modo extraordinário e eficaz os valores humanos e femininos de sua condição, e exorta cada mulher e cada homem a entrar nesse caminho. Seu itinerário é universal: homens e mulheres são chamados a um propósito maior, encontrando sentido na entrega livre e generosa ao Criador.
Na Mãe de Jesus, encontramos não apenas um modelo feminino, mas um modelo humano. Suas virtudes – fé, abertura, humildade, caridade e disponibilidade – têm valor atemporal. Sua grandeza está na extraordinária simplicidade do cotidiano. Mesmo vivendo sob regras patriarcais, ela é livre para abraçar a maior novidade da história: gerar o Cristo ao mundo. Longe de ser submissa. Maria é uma mulher de decisão. Como noiva prometida, não teme acolher um projeto maior do que o seu e de seu noivo. Acusada e mal interpretada, não hesitou em correr o risco de ser rejeitada e apedrejada. Seu sim é um ato de liberdade, um encontro entre a vontade divina e a coragem de uma jovem de Nazaré.
A presença de Maria na história da salvação evidencia que o plano divino envolve igualmente homens e mulheres. Maria é o testemunho feminino por excelência, o ícone da Igreja. Desde o início, coopera com os discípulos, assumindo papel essencial no cristianismo nascente. Sua presença é ativa, fecunda e indispensável. Na Mãe de Deus, a mulher é valorizada em sua essência, não como figura secundária, mas como participante fundamental na história da redenção.
Maria nos recorda que a verdadeira força feminina não está na oposição, mas na plenitude de sua identidade, na coragem de dizer sim ao que é maior que ela mesma, na liberdade que encontra no amor a Deus e ao próximo. Seu testemunho é um chamado para que todos, homens e mulheres, vivam em plenitude e liberdade diante do Criador.
Dom Leomar Antônio Brustolin – Arcebispo Metropolitano de Santa Maria e Presidente do Regional Sul 3