Cuidar dos Pobres – Opção do Cristão

Jesus Cristo proclama o Evangelho do Reino de Deus aos pobres, isto é, aos famintos, aos desempregados, aos doentes, aos desesperançados e aos sofredores. No lado oposto a estes estão os “violentos” – conceito que descreve uma pessoa que empobrece os outros e se enriquece à custa deles. Com essa definição, afirma-se que não se deve restringir o conceito de pobreza ao plano religioso. Refuta, ainda, quem considera os pobres do Evangelho num sentido apenas econômico ou somente psíquico. Essa categoria define-se pela característica desumanização do ser humano, que ela comporta nas suas diversas dimensões.

O conceito oposto ao de pobre, no Antigo Testamento, é o de violento, daquele que causa sofrimento ao pobre, o que promove uma vida miserável, aquele que não respeita os direitos dos outros, nem se sente no dever de agradecer a ninguém. São todos os que vivem com as mãos fechadas, indivíduos que não se referem aos outros e nem estão abertos aos outros.

O anúncio de Jesus não promete ainda aos pobres o fim da fome e a plenitude de uma vida farta. Trata-se de trazer uma nova dignidade. O Evangelho não oferece aos pobres uma utopia que lhes console no presente, mas muito mais, um futuro de Deus que, através deles, chega ao seu presente. O Reino de Deus torna-se o reino messiânico dos pobres. Trata-se de um Reino já presente em Jesus e na sua pregação e obras. A promessa de Jesus leva os pobres pelo caminho de comunhão.

O Evangelho de Jesus também tem uma mensagem para os ricos. Se, de um lado, anuncia a Boa Nova aos pobres (Lc 4,18), a quem pertence o Reino de Deus (Mt 5,3), do outro, é um forte apelo de conversão aos ricos (Mt 6,24). Converter-se significa viver na antecipação de um Reino de Deus que nos precede, e que realiza uma reviravolta da violência para a justiça, do isolamento à comunhão, da morte, para a vida. A conversão possibilita o seguimento de Jesus a homens e mulheres que representam a nova comunidade messiânica. Essa comunidade, nos primeiros tempos do cristianismo, era composta de pobres e ricos, de tal modo que estes últimos exercitavam o dever da misericórdia no confronto com os necessitados.

Ricos e pobres, todos, são chamados a superar tudo o que divide, separa e exclui. O Evangelho do Reino propõe pessoas felizes, capazes de promover o bem comum, a justiça restaurativa e a partilha. Tudo isso pode parecer utópico, contudo, aqueles que foram capazes de rever suas vidas e buscarem relações mais respeitosas para com o próximo, encontrarão uma paz que poucos conseguem.

Os primeiros cristãos deixaram um legado que até hoje se sustenta na Igreja, com o cuidado com os pobres, sem excluir ninguém, chamando todos à conversão ao Reino.  Nesse sentido, há dois mil anos o Cristianismo entende que a situação de pobreza não é querida por Deus, e o que importa mesmo não é como o pobre é, mas como o tratamos, em nome de Jesus. Serve como exemplo o que escreveu São Basílio, que viveu na Capadócia no quarto século: A quem fiz justiça conservando o que é meu? Diga-me, sinceramente, o que lhe pertence? De quem o recebeu? Se cada um se contentasse com o necessário e desse aos pobres o supérfluo, não haveria nem ricos nem pobres”. E o santo deu exemplo, desfez-se de seus bens e criou, na cidade de Cesareia, uma verdadeira cruzada de serviços aos pobres, fundando hospitais, asilos, casas de repouso, escolas de artesanato, etc.

Dom Leomar Antônio Brustolin – Arcebispo Metropolitano de Santa Maria