São Francisco – O Irmão Universal

No início do mês de outubro, mais precisamente no dia quatro, recorda-se São Francisco de Assis, um homem que viveu na Idade Média e tem uma mensagem sempre atual. Pode-se dizer que o “poverello” – o pobrezinho de Assis é um homem universal, capaz de inspirar homens e mulheres de todos os tempos e de todas as regiões do planeta na busca de uma vida integrada.

A tradição popular coloca São Francisco como o padroeiro dos animais. De fato, ele amou muito a natureza, a ponto de exclamar: irmão sol, irmã luz, irmão lobo e irmã água! Sua consciência de pertença ao cosmos criado por Deus Pai, fê-lo compreender que somos todos irmãos, por isso ele é chamado de irmão universal. Engana-se, contudo, quem pensa que a primeira consciência que o Santo teve foi a da sua fraternidade com animais, plantas e estrelas. Partindo de um encontro íntimo com Jesus, na igrejinha de São Damião em Assis, no ano de 1206, é que Francisco entendeu que sua vida faustosa e vazia exigia maior profundidade. Sua primeira mudança ocorreu em relação aos leprosos, por quem nutria grande repulsa. Superando todas as suas resistências, certa feita, ao encontrar um leproso nas ruas de Assis, revestiu-se de coragem e abraçou e beijou aquele homem com doença contagiosa, pustulento e mal cheiroso.

Aquele gesto para com o leproso libertou Francisco. Aos poucos cresceu nele o desejo ver essa irmandade de toda criação. Ele mesmo chega a escrever em seu testamento: “aquilo que me parecia amargo converteu-se para mim em doçura da alma e do corpo; e depois parei um pouco e saí do século.” A expressão sair do século indica sua ruptura com um mundo marcado por vaidades, materialismo e poderes que separavam e dividiam as pessoas, esquecendo especialmente dos doentes e pobres.  Somente quando foi capaz de rever sua relação com as pessoas é que alguém pode realmente compreender sua relação com a natureza.  Saber equilibrar a vida com seus muitos encontros e desencontros é um desafio. A fraternidade universal que Francisco ensina supõe amar cada pessoa de forma única e igualmente sentir-se parte de um todo maior, no qual as plantas, os animais e até os minerais, bem como os astros, são considerados irmãos. Essa consciência depende de um adequado sentimento de paternidade, que encontra em Deus sua origem e meta. Há muitas pessoas que se sentem órfãs dessa paternidade divina, pois não se deixam amar pelo Amor. Por isso Francisco repetia muitas vezes, o Amor não é amado!

Deixar-se amar por Deus e saber amar as pessoas e toda a criação é a causa e a consequência da fraternidade universal. Cuidar mais de animais do que de doentes, idosos e pobres, é perder a chance maravilhosa de encontrarmos o equilíbrio que tanto buscamos e nem sempre encontramos. Não se trata de escolher pessoas ou animais, mas é evidente que toda pessoa é imagem e semelhança de Deus. É claro que as relações nem sempre são fáceis entre semelhantes, mas sem eles, nos desumanizamos.

Quanto mais nos desafiamos em encontrar as pessoas, mais somos capazes de nos encontrarmos em nossa existência. São Francisco foi tão eloquente no seu estilo de vida, que em poucos anos reuniu milhares de homens e mulheres dispostos a seguir o mesmo caminho. A força desse senso de pertencimento e de fraternidade, atrai, equilibra e orienta a vida.

Nos últimos séculos, muito se tem clamado por liberdade e igualdade, urge, entretanto, reforçar o clamor por fraternidade, cuja raiz se encontra num único Pai de todos, que a todos convoca a uma nova relação com Ele, com as pessoas, com a natureza e conosco mesmos. São Francisco, rogai por nós!

Dom Leomar Antônio Brustolin – Arcebispo de Santa Maria