Só o amor nos torna humanos
A busca da compreensão de Deus Pai e Filho e Espírito Santo, a Santíssima Trindade, é a novidade absoluta do cristianismo. Ao enviar o Filho, nascido da Virgem Maria, e o Espírito Santo, completa-se a manifestação de Deus Trindade. A celebração da Solenidade da Santíssima Trindade nos faz pensar em que este grande mistério de nossa fé tem a ver com nossa vida cristã concreta. Podemos resumir na conhecida expressão: a Santíssima Trindade é nossa origem, nosso modelo e nossa meta. Seu coração é o amor e somente nele nos tornamos humanos.
Primeiro, um modo de nos aproximarmos de Deus. Não nos é permitido falar de Deus como o fazemos para falar das ciências. Para falar de Deus é preciso um silêncio interior, a abertura de um espaço, a pureza de coração para escutar a sua voz. É preciso silenciar o intelecto e a vontade, os sentidos, para acercar-se da realidade de Deus. Segundo Ricardo de São Vítor, abrir o “terceiro olho” o oculus fidei (olho da fé), permitindo-nos o acesso a uma dimensão da realidade que transcende, sem negar, o que captam a inteligência e os sentidos. Então, não se trata de explicar a Trindade, mas de acolher sua presença, sua visita, sua companhia.
Existimos em Deus, com Deus e para Deus. “Pois nele vivemos, nos movemos e existimos (At 17,28). Vivemos na corrente de amor entre o Pai e o Filho. A Trindade é nossa origem, modelo e pátria. Fomos criados à imagem da Trindade, por isso nossa identidade, nossa marca fundamental, é o amor. A existência humana, individual e social, é um ícone da comunhão trinitária. O homem é constitutivamente capaz de amar e chamado a dar o amor: amado desde a eternidade, existe para amar. Enfim, caminhamos para a felicidade plena e escatológica na comunhão trinitária. Somos de Cristo, pelo batismo. Fomos inseridos na dinâmica da vida trinitária. “Todos vós que fostes batizados em Cristo, vos revestistes de Cristo… todos vós sois um só em Cristo Jesus” (Gl 3,27-28). Sempre que vivemos para servir e amar, deixamos transparecer a imagem de Deus em nós. O verdadeiro sentido da vida nos é revelado na Trindade: “Nossa vida está escondida com Cristo em Deus” (Cl 3,3). A Trindade habita em nós, pelo Espírito: “O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5). Nesta dinâmica de amor nós somos envolvidos. “Somos todos um no Pai e no Filho e no Espírito Santo” (S. Cirilo de Alexandria).
Contemplando a Santíssima Trindade sabemos com clareza que somente o amor nos torna humanos. Sendo Deus a mais perfeita comunhão, todo individualismo falseia o ser humano. Sendo Deus sempre acolhedor, não podemos discriminar e julgar, mas abrir espaço para que todos tenham lugar, sem exclusões. Sendo Deus amor que se doa totalmente (cf. Jo 3,16), que lugar pode ter a mesquinhez em nossos relacionamentos? Na vida familiar, as relações devem se construir tendo como base o amor recíproco, que se encontram na Trindade. Deus Pai volta-se totalmente para o Filho e diz “este é o meu filho amado” (Mt 3,17) e o Filho, encontra sua segurança nas mãos do Pai: “pois eu desci do céu, não para fazer a minha própria vontade, mas a vontade daquele que me enviou” (Jo 6,38). Portanto, vivemos porque somos amados e existimos para amar.
“Deus é amor: quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele” (1Jo 4,16). Amor com a marca trinitária é o amor pelo outro que se caracteriza pelo desejo de fazer o que é melhor para ele. É, sobretudo, um ato de vontade, uma determinação livre da pessoa.
Dom Adelar Baruffi – Bispo Diocesano de Cruz Alta