A dignidade do trabalho

Escrevia São João Paulo II, na encíclica Laborens Exercens – LE – “Sobre o trabalho humano” em 1981, que o “trabalho humano é uma chave, provavelmente a chave essencial, de toda a questão social, se nós procurarmos vê-la verdadeiramente sob o ponto de vista do bem do homem”. (LE 3) A pandemia do coronavírus confirma esta afirmação. Foram tomadas medidas sanitárias, urgentes e necessárias, para controlar a disseminação do vírus. Medidas que restringiram ou impediram milhões de trabalhar. Por causa disso milhões de pessoas perderam o trabalho e outros milhões não podem trabalhar reduzindo drasticamente a renda para o próprio sustento ficando dependentes da primeira necessidade básica, o alimento.

Dia 1º de maio é celebrado, no mundo, o “Dia do Trabalhador”. Todos os dias comemorativos são uma oportunidade para reflexão, avaliação, tomada de posições. A Doutrina Social da Igreja oferece sua contribuição que parte de aspectos bíblicos, de ensinamentos da Tradição e dos ensinamentos dos papas, principalmente a partir de 1891 com a Rerum Novarum. Desde a revolução industrial as mudanças no mundo do trabalho se tornaram mais frequentes e profundas. A síntese destes ensinamentos se encontra no Compêndio da Doutrina Social da Igreja – DSI. A chave de leitura que envolve o mundo do trabalho é a “inalienável dignidade da pessoa humana”.

Todo trabalho tem uma dimensão objetiva e uma subjetiva. O sentido objetivo é o conjunto de atividades, recursos, instrumentos e técnicas usadas para produzir. O sentido subjetivo é o agir do homem enquanto ser dinâmico, capaz de realizar várias ações que pertencem ao processo do trabalho e que correspondem às suas capacidades pessoais. As técnicas de produção, locais de produção variam de atividade para atividade e de tempos em tempos, isto é contingente. O que é estável é a dimensão subjetiva. É sempre uma pessoa dotada de dignidade, liberdade, habilidades, sentimentos que realiza o trabalho. Por isso, o produto do trabalho tem algo de quem o realizou. Diante disso, “a dimensão subjetiva do trabalho deve ter a preeminência sobre a objetiva, porque é aquela do homem mesmo que realiza o trabalho, determinando-lhe a qualidade e o valor mais alto” (DSI 271).

“O trabalho é um direito fundamental e é um bem para o homem: um bem útil, digno dele porque apto a exprimir e a acrescer a dignidade humana”. O trabalho é necessário para formar e manter uma família, para ter direito à propriedade, para contribuir para o bem comum da família humana”. (DSI 287) O desemprego foi qualificado por São João Paulo II como uma “verdadeira calamidade social” (LE, 18). A situação atual de desemprego clama que o Estado e a sociedade civil se empenhem em promover políticas que gerem emprego.

A pandemia tornou mais visível o grave problema social da injusta distribuição de renda. Em poucos dias de pandemia, uma multidão começou a depender e sobreviver com doações de produtos de primeira necessidade. “O bem-estar econômico de um País não se mede exclusivamente pela quantidade de bens produzidos, mas também levando em conta o modo como são produzidos e o grau de equidade na distribuição das rendas, que a todos deveria consentir ter à disposição o que é necessário para desenvolvimento e aperfeiçoamento da própria pessoa. Uma distribuição equitativa da renda deve ser buscada com base em critérios não da justiça comunitativa, mas também de justiça social, ou seja, considerando, além do valor objetivo das prestações de trabalho, a dignidade humana dos sujeitos que as realizam. Um bem-estar econômico autêntico se persegue também através de adequadas políticas sociais de redistribuição da renda que, tendo em conta as condições gerais, considerem oportunamente os méritos e as necessidades de cada cidadão” (DSI 303).

Dom Rodolfo Luís Weber – Arcebispo de Passo Fundo