A força edificante da gentileza
Na solenidade de Pentecostes, neste último domingo de maio, nos países do hemisfério sul, se dá também encerramento da Semana de Oração pela Unidade Cristã. A cada ano, esta Semana tem subsídio a partir de um versículo da Bíblia, elaborado por Igrejas de um País. O subsídio deste ano foi redigido pelas Igrejas de Malta e de Gozo.
No contexto do desafio dos milhões de migrantes e refugiados atualmente, valeram-se da passagem da parte final do capitulo 27 do livro dos Atos dos Apóstolos e início do capítulo 28. Narra o naufrágio do navio que levava 276 pessoas para Roma no mar Adriático, atingido por violenta tempestade. Entre elas, havia muitos prisioneiros. São Paulo era um deles. Com sua habilidade, os marinheiros conseguiram firmar o navio, já destroçado, na Ilha de Malta. Os habitantes acolheram a todos com “benevolência fora do comum”, segundo algumas traduções, ou com ”extraordinária gentileza”, segundo outras. Acenderam uma fogueira para se aquecerem, hospedaram-nos por três dias e lhes deram provisões para que seguissem a Roma por outro navio.
Utilizando a segunda alternativa, o subsídio, adaptado para o Brasil, formulou como lema da Semana “gentileza gera gentileza”.
Em muitas circunstâncias desafiadoras, constatamos gestos edificantes de gentileza ou de benevolência. Para citar um, quando na atual pandemia do Coronavírus, o Governo da Itália estabeleceu o isolamento social, um gesto destacado foi o de jovens que se ofereciam para ir ao mercado, à padaria, à farmácia e a outros locais em lugar dos idosos. Cada um certamente já está lembrando diversos outros nas suas relações.
Pode-se também lembrar a insistência na família, na escola, na catequese na utilização das palavrinhas clássicas da gentileza, por favor, obrigado, desculpe. Parece que há algum tempo eram mais frequentes gestos de gentileza, como o de pessoas mais novas cederem lugar para as mais idosas no ônibus, em sala de espera, em salão comunitário, na igreja.
A convivência familiar, comunitária e social seria imensamente mais pacífica e harmoniosa se houvesse sempre, especialmente nos momentos de alguma tensão ou carências como na atual pandemia, “benevolência fora do comum” ou “extraordinária gentileza”.
Infelizmente, como lembra tanto nosso Papa Francisco, há ainda muita indiferença. Quando foi à ilha de Lampedusa, no Sul da Itália, para onde milhares migrantes se dirigem, muitos deles não chegando, morrendo no mar, no dia 08 de julho de 2013, ele afirmou que a cultura do bem-estar, que nos leva a pensar em nós mesmos, nos torna insensíveis ao grito dos outros, nos leva até mesmo à globalização da indiferença. E questionou duramente: “Quem de nós chorou por este fato (um naufrágio com muitos mortos) e pelos fatos como este?”. Estamos em uma sociedade que esqueceu a experiência do chorar, do “padecer com”: a globalização da indiferença nos tirou a capacidade de chorar!
A gentileza tem imensa força edificante. Cultivada, gera mais gentileza. Será sempre gratificante cultivá-la, mesmo que tenhamos o nada edificante comportamento de pessoas e algumas de grande responsabilidade pública a agirem impulsivamente, com xingamentos, ofensas e menosprezo a outros, quando deveriam testemunhar sentimentos de compaixão e compromissos com o bem de todos, especialmente os descartados da sociedade.
Que o Espírito Santo, neste tempo de pandemia, aqueça e faça arder o coração de todos para relações de compaixão e extraordinária benevolência.
Pe. Antonio Valentini Neto – Administrador Diocesano de Erexim