A pandemia do Coronavírus e as Religiões
Em tempos de catástrofes, guerras e epidemias, emerge, instantaneamente, o caráter religioso das pessoas. E é nestes momentos também que as religiões são colocadas à prova e as diferentes concepções de Deus são testadas. Não está sendo diferente, neste ano, com a pandemia do Coronavírus.
Assim que o Covid-19 chegou na Itália e os hospitais começaram a não mais dar conta da demanda, cristãos de diferentes designações começaram a falar sobre a necessidade de incrementar as orações. Houve quem dissesse que é castigo de Deus, que é uma prova a que Deus está nos submetendo ou que é um alerta que Deus está fazendo para que a humanidade se lembre dele. Houve pastores e padres dizendo que as pessoas estariam protegidas do contágio se perseverassem na oração. Houve quem prometeu a cura através de bênçãos, procissões e orações. Pessoas comuns começaram a dizer que se sentiam protegidas “porque eram muito religiosas e, ou, muito devotas”.
Chama a atenção que, em no mínimo três países, os cultos religiosos foram grandes focos de disseminação do vírus. Na Coreia do Sul, os fiéis que participaram de um culto em uma igreja local, foram os responsáveis por boa parte das contaminações. Na França, um culto evangélico realizado no dia 18 de fevereiro, disseminou o vírus para vários países, sendo que centenas de pessoas que participaram do culto resultaram infectadas. Na Índia, uma celebração em uma Mesquita, é apontada como um dos principais focos de disseminação do vírus na região. Aqui no Brasil, contrariando as orientações das autoridades sanitárias, algumas lideranças religiosas se negaram a fechar os templos para cultos e missas, sob a alegação de que, é neste momento, que o povo mais precisa da Igreja. A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), em acordo ao que sugerem as ciências e apontam as autoridades da saúde, orientou as dioceses a manterem as portas das igrejas fechadas para as celebrações enquanto incentiva a transmissão das missas pelas redes sociais e rádios.
Apesar de não negar eventuais milagres, é evidente que nenhuma religião consegue blindar de tal forma as pessoas que o vírus não consegue penetrar. Também nenhuma pessoa pode se sentir livre do contágio pelo simples fato de ser pessoa de fé. O que de fato previne o contágio é o afastamento dos lugares onde circulam potenciais portadores do vírus, o que muito bem pode estar a acontecer em uma multidão reunida para uma celebração religiosa. Por isso, a insistência: “Fiquem em casa”. Por mais importante que seja a participação nas celebrações religiosas, neste momento, ela não é essencial. Podemos, muito bem, rezar com a família em casa a partir da Bíblia ou de outro livro de orações que temos conosco. Também podemos nos unir à nossa comunidade de fé através das redes sociais e meios de comunicação social. Podemos acompanhar missas, cultos e catequeses a partir de casa, criando um clima favorável para acolher a Palavra de Deus e nos unir em oração com os irmãos que estão rezando em outras casas e templos.
A pandemia do coronavírus, assim como todas as epidemias, catástrofes e guerras, é também uma bela oportunidade para purificar a concepção de Deus. Sem entrar em discussões, devemos evitar jogar a culpa em Deus ou esperar que Ele resolva a questão. O Deus em quem os cristãos acreditam, é o Deus Pai e Mãe de Bondade, que caminha junto conosco. Ele está padecendo com as pessoas que sofrem nos hospitais ou estão confinadas em suas casas. Com sua graça, Ele está presente junto aos médicos, enfermeiros, faxineiros, cozinheiros, motoristas, comunicadores e pesquisadores. Também está presente com as lideranças religiosas que rezam, com as pessoas que garantem os serviços essenciais, com as entidades que zelam para que a ninguém falte comida e acolhida. A única certeza que a fé cristã nos dá, neste momento, é que nós não estamos sozinhos. Deus está conosco! E se Deus está conosco, a dor, o sofrimento e a morte, serão vencidos pela Ressurreição.
Na certeza da presença amorosa de Deus, sigamos juntos no combate ao vírus que está a nos atormentar e tenhamos uma abençoada Semana Santa.
Pe. Roque Hammes – Coordenação de Pastoral da Diocese de Santa Cruz do Sul