Ascensão e Pentecostes

Continuamos a celebrar o Tempo Pascal na liturgia da Igreja, o qual se prolonga até Pentecostes. Antes, porém, da vinda do Espírito Santo, Jesus subiu aos céus, mistério que denominamos com a expressão: Ascensão do Senhor. Os textos bíblicos deste fato, celebrado 40 dias depois da ressurreição, se relacionam com a missão dos discípulos de continuar o anúncio da Boa Nova de Jesus, em todos os lugares e por todos os tempos (cf. Mc 16, 15-20; At 1, 1-11).

Para compreender seu sentido é preciso relacionar a Ascensão do Senhor com o mistério da Encarnação (Nascimento). Na linguagem litúrgico-celebrativa de ambas encontramos a expressão: “troca (ou comunhão) de dons entre o céu e a terra”. Na reflexão teológico-litúrgica, em Jesus Cristo, Deus desce ao encontro da pessoa humana. O verbo descer (ser servo: lava-pés) mostra como a iniciativa amorosa de Deus coloca seu coração junto à miséria humana (miséria + coração = misericórdia) para redimi-la e renovar a aliança rompida: é o encontro do divino com o humano para que este possa entrar em comunhão com a divindade e ser salvo.

Qual é então o sentido da Ascensão do Senhor? O mesmo Jesus, o “Verbo que se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1, 14), que desceu do seio da Trindade ao nosso encontro, agora, na Ascensão, toma o movimento inverso: sobe aos céus, elevando junto com ele nossa humanidade. Por isso exulta o segundo Prefácio da Ascensão, com estas palavras: “Ele subiu aos céus, a fim de nos tornar participantes da sua divindade”. E a Igreja reza: “Ó Deus todo-poderoso, a ascensão do vosso Filho já é nossa vitória”.

A Igreja celebra a Ascensão do Senhor com alegria, pois Jesus Cristo, à direita do Pai, já representa nossa humanidade. Na esperança, já participamos de sua glória. A Igreja une-se ao Senhor que permanece conosco até o fim dos tempos e está também nos céus, não se afastando de nossa humanidade, mas elevando-a para junto do Pai, tornando-se Mediador e atraindo-nos para a realidade celestial. A dimensão da esperança, tão necessária em nossa vida, é fortificada ao celebrarmos a Ascensão, pois ela aponta para a dimensão eterna da nossa vida: “Quem crê tem futuro” (cf. Bento XVI).

50 dias após a Páscoa, a Igreja celebra Pentecostes, como a vinda do Espírito Santo. Segundo São Paulo, é o Espírito Santo que une, congrega e forma a Igreja como um só corpo, embora constituída de muitos membros (cf. 1Cor 12, 12ss). Referindo-se à unidade e à vivificação do Espírito, afirma Santo Irineu (séc. II): “Assim como a farinha seca não pode, sem água, tornar-se uma só massa nem um só pão, nós também, que somos muitos, não podemos transformar-nos num só corpo, em Cristo Jesus, sem a água que vem do céu (LH, vol. II, Solenidade de Pentecostes, p. 926).

Este Espírito Santo, que se manifesta, que une e faz caminhar juntos, está verdadeiramente atuante na vida cristã e, sobretudo, em cada ação litúrgica. Sem a sua presença e manifestação não há liturgia, pois nela acontece uma espécie de sinergia (força conjunta) entre o Espírito Santo e a Igreja. Na ação conjunta o Espírito cria condições em nós para participarmos do mistério celebrado; recorda e manifesta o mistério de Cristo que é atuado na ação litúrgica; transforma-nos, tornando real em nós a Páscoa de Cristo; Ele nos congrega na comunhão de um só corpo eclesial (cf. CIgC 1093-1109).

O Espírito do Senhor nos conduza neste tempo de caminharmos juntos como Igreja (sinodalidade), mesmo em meio ao mundo de tantos ódios e polarizações.

Dom Aloísio Alberto Dilli – Bispo de Santa Cruz do Sul