Cidadania Planetária
Dom Jaime Pedro Kohl – Bispo de Osório
Preparando-nos para receber a reflexão da Campanha da Fraternidade de 2017 sobre os “biomas brasileiros e a defesa da vida” em continuidade com o cuidado da Casa Comum achei importante partilhar com vocês essa reflexão do professor em Teologia, Memore Restori, na revista Mundo e Missão de janeiro e fevereiro deste ano.
Diz ele que “a contemporaneidade pode ser definida como ‘era planetária’, onde tudo está interligado seja na realidade humana como na realidade planetária. É uma era em que todos os seres humanos se encontram, unidos numa espécie de comunidade do destino cada vez maior (Edegar Morin).
A era planetária tem sua origem no início da diáspora do homo sapiens pelo planeta, desenvolvendo-se na Idade Moderna através das grandes navegações e descoberta de novos povos, alcançando o seu ápice no final do século 20 com o fenômeno da globalização.
Nos anos sessenta, o filosofo canadense McLuhan criou o conceito de ‘aldeia global’ a partir dos feitos da comunicação que estava reduzindo, de forma inacreditável, as distâncias entre os povos. O que parecia ‘ficção’ hoje é pura realidade ao ‘toque de um clique’.
Com o enorme desenvolvimento operado no campo científico e tecnológico, desde meados do século 20, a humanidade deparou-se com uma realidade onde as possibilidades e os desafios se apresentam ao mesmo tempo. Hoje se vive nas fronteiras, onde povos e culturas se encontram e ‘desencontram’ abrindo novos horizontes, travando novos conflitos e reerguendo ‘muros da vergonha’.
Perante este contexto mundial que se configura na ‘aldeia global’ faz-se urgente recontextualizar a educação, na forma básica do cidadão, tendo presente que hoje a pertença não é mais local, mas global; isto é, o ser humano precisa tomar consciência de sua cidadania planetária, membro da humanidade, com responsabilidades universais, inclusive com a Mãe Terra.
Se esta realidade é, por um lado fascinante, pelo fato que o desafio se torna apaixonante; por outro, apresenta seu aspecto mais sombrio e assustador, devido aos efeitos nefastos da globalização neoliberal que está produzindo em larga escala, a exclusão social, a homogeneização cultural e o mito do bem-estar pessoal, afrouxando e até rompendo os relacionamentos entre os indivíduos, entre as sociedades e culturas, com a natureza e o transcendente. Por isso, considerando os ‘quatro pilares da educação’, vale a pena destacar o quarto: ‘aprender a viver juntos, aprender a viver com os outros’(Jacques Delors).
Através dessa breve introdução nos propomos, ao longo deste ano, abordar o tema da ‘Educação à Mundialidade e Interculturalidade; visando “promover uma sociedade que respeite as diferenças, combatendo o preconceito e a discriminação nas mais diversas esferas, efetivando a convivência pacífica das várias etnias, culturas e expressões religiosas, o respeito às legítimas diferenças” (DGAE n.116).
Como escreve o papa Francisco: “Amamos este magnífico planeta, onde Deus nos colocou, e amamos a humanidade que o habita. A terra é a nossa casa comum, e todos somos irmãos” (EG 183).
Essa é consciência que deve desabrochar nos nossos ambientes eclesiais e sociais, plenamente em sintonia com o espírito missionário e o sentir dos homens e mulheres de boa vontade, abertos ao diálogo e a comunhão não só com as pessoas, mas o planeta como um todo.
Se levarmos a sério o evangelho deste domingo que pede de “amar os nossos inimigos e rezar por aqueles que nos perseguem” percebemos essa plena sintonia, porque nesse conceito de cidadania planetária ninguém mais é inimigo, mas todos se reconhecem e se relacionam como irmãos e irmãs.
Alimentando essa esperança e esse ideal, estaremos vivenciando o Evangelho da Vida e cooperando na construção de um mundo muito mais humano e mais irmão; e a humanidade avança numa nova direção – a do homo agapicus – a partir da encruzilhada em se encontra, hoje.
Como explica Chiara Lubich o amor cristão é proativo (toma iniciativa), inclusivo (ama a todos), empático (coloca-se no lugar do outro), respeitoso (reconhecendo no outro sua elevada dignidade), tolerante (ama até o ‘inimigo’) e recíproco (‘amai-vos uns aos outros’). Eu acrescentaria: um amor planetário (não faz nenhuma discriminação de pessoas).