Empatia Seletiva

 

Você já deve ter passado por situação semelhante. Talvez não tenha sido diretamente relacionado à sua pessoa, mas já vivenciou, com certeza. Está em algum ambiente descontraído, as pessoas riem, trocam gentilezas e, de repente, tudo se transforma. Com a entrada de outro alguém os rostos se fecham, a simpatia-empatia acaba. Empatia seletiva, um termo usado para designar os que escolhem a quem tratar bem.

Pessoas que só cumprimentam os que lhe agradam, que beiram à deselegância e ao desrespeito para com os semelhantes, que nada lhes podem oferecer em troca, andam pelo mundo a ferir os outros de forma gratuita e sem escrúpulos. Nossos olhos nos traem, rotulamos pela cor da pele, pelo traje que usam e por muitos outros critérios equivocados distribuindo as pessoas em classes que merecem e que não merecem nosso “bom-dia”, “com licença”, “muito obrigado”. Fazemos do mundo um palco no qual representamos elegância, educação e imaginamos que todos comprem nossa pseudo-etiqueta.

Por outro lado, pouco nos importamos com o que pensam de nós. Os “inferiores” não importam! Perdemos totalmente a compostura cometendo horrores que, se filmássemos nossas reações e atitudes, certamente nos assustaríamos com nossa propensão à insensibilidade, à desumanidade.  Como podemos ser tão gentis com alguns e, com outros, descermos tão baixo na escala dos valores a ponto de nos esquecermos daqueles que esperam de nós um mínimo de civilidade e respeito?

Empatia Seletiva tem a ver com o direcionamento dos afetos. Ninguém é obrigado a gostar de todo mundo, mas daí a ser indiferente, grosseiro e ignorar que exista alguém ao meu lado no elevador, que alguém tenha chegado antes para ser atendido ou tratar alguém de acordo com suas condições financeiras, beira à boçalidade e ao primitivo. Precisamos, com urgência, de uma educação para o afeto, aquela mesma que Lévinas com tanta maestria explicita ao falar da alteridade que suplica ao expor o seu rosto: “não me destruas”. Há muitos ao nosso redor, talvez estejamos nesse grupo, tão cheios de si, que pensam ser melhores que os outros  e- pior- imaginam que ninguém vê o comportamento discriminatório e desumano com o qual tratam os que não lhes interessam.

Precisamos da Empatia Reversa, aquela mesma que dá atenção, cuida, escuta e acolhe os que ninguém vê, que para a grande maioria não têm valor algum. Há muito tempo aprendi que pobres mesmo são os que tratam com diferença os humildes, os pequenos, os que não têm nada para dar em troca. Não quero, porém, encerrar este texto sem considerar tantos e tantas que, mesmo tendo boa posição financeira e alto nível acadêmico, parecem oásis de humanidade dando-nos lições cotidianas de sensibilidade, cuidado, afeto e compaixão para com quem vive à margem da vida. Neles vislumbro um pequeno, mas potente raio de esperança. Prestemos atenção em quem vive assim e sigamos de perto os seus passos. Troquemos já a empatia seletiva pela empatia reversa. Talvez não resolva tudo e os “homens das cavernas” prossigam sua odisseia ferindo e ignorando pessoas, mas pode ser um bom antídoto para tanta falta de “empatia” que presenciamos nesta pobre e perdida sociedade.

 

Prof. Dr. Rogério Ferraz de Andrade
Secretário Executivo do Regional Sul 3