Exorcismo – Renunciar ao Mal
Uma recente produção do cinema mundial reacendeu o debate e até a polêmica em torno dos exorcismos. Não raras vezes, a fantasia e os exageros distorcem o sentido e o significado dessa prática que remonta às origens do Cristianismo. Recuperar uma abordagem fiel à tradição cristã pode ajudar trazendo elementos que permitam um bom discernimento sobre essa realidade. Na Antiguidade, São João Crisóstomo declarava aos cristãos de Antioquia: “Não é para mim nenhum prazer falar-vos do diabo, mas a doutrina que este tema me sugere será muito útil para vós.”
Considerando que há possibilidade de, em alguns casos, ocorrer uma possessão demoníaca, a Igreja, cautelosamente, adota algumas medidas que evitam tanto o sensacionalismo quanto o descaso. Um recente subsídio doutrinal da “Comissão de Doutrina da Fé” da CNBB sobre exorcismos esclarece alguns pontos que apresentamos de forma bem suscinta.
A vida cristã é marcada por uma constante luta contra o pecado e o poder do mal. Exorcizar quer dizer expulsar um demônio, conjurando-o em nome de Deus. O exorcismo pode ocorrer pela forma deprecativa ou pela forma imperativa. A forma deprecativa se realiza pelas orações dirigidas a Deus para afastar um mal, personificado ou não. Ocorre, por exemplo, na liturgia batismal, especialmente nos exorcismos sobre os catecúmenos, para que possam enfrentar e vencer as tentações que os ameaçam no seguimento de Jesus Cristo.
A forma imperativa de exorcismo contém ordens diretas de mando no demônio. Ele se realiza quando ocorrem casos de especial tormento ou de possessão demoníaca que prejudicam alguém que faz parte do Povo de Deus. Trata-se de uma misteriosa manifestação da iniquidade que atua no mundo.
Desde o ritual de exorcismo do ano de 1614, aparece a preocupação da Igreja acerca dos sintomas que poderiam permitir um diagnóstico de possessão demoníaca. O mesmo cuidado está presente na nova edição do ritual de 1998.
Os sintomas reconhecidos, para identificar uma real possessão demoníaca, são: falar muitas palavras em uma língua desconhecida ou entender alguém que a fale; manifestar coisas distantes ou ocultas; demonstrar forças superiores à idade ou às condições físicas. Esses indícios também devem vir acompanhados de sinais de ordem moral e espiritual como grande aversão ao nome de Jesus, à Virgem Maria, aos Santos, à Igreja, aos ritos, aos sacramentais e às imagens sacras.
A partir da segunda metade do séc. XIX, constatou-se que, em muitas situações, a presumível possessão demoníaca tratava-se, na verdade, de caso patológico. O conceito de histeria constituía o denominador comum para designar esses fatos. Os estudos de Psicologia e de outras ciências sobre o fenômeno que denominamos “possessão demoníaca” remetem à necessidade de proceder a uma análise interdisciplinar.
A autorização, para que seja feito exorcismo em uma pessoa, deveria ser a possibilidade última e jamais a primeira hipótese. A autorização de execução de um exorcismo somente pode ser dada pelo bispo local que designará um sacerdote, para que realize o exorcismo. A pluralidade de requisitos não pode, porém, colocar o dado da fé e da Teologia apenas como um elemento secundário na discussão do caso. A possessão demoníaca se esclarece e se resolve no âmbito da fé cristã, por isso a palavra lúcida e de bom-senso da Igreja tem um peso determinante na decisão final.
Dom Leomar Antônio Brustolin – Arcebispo Metropolitano de Santa Maria e Presidente do Regional Sul 3