O mundo é migrante
Dom Adilson Pedro Busin, cs – Bispo auxiliar de Porto Alegre
“Migram as sementes nas asas dos ventos, migram as plantas de continente a continente, levadas pelas correntes das águas, migram os pássaros e os animais e, mais que todos, migra o homem, ora em forma coletiva, ora em forma isolada, mas sempre instrumento daquela Providência que preside e guia os destinos humanos, também através de catástrofes, para a meta, que é o aperfeiçoamento do homem sobre a terra e a glória de Deus nos céus (Scalabrini, 1899).
Celebramos, de 18 a 25 de junho, a 32ª Semana do Migrante, com o tema “Migração, Biomas e Bem Viver” e o lema “Uma oportunidade para imaginar outros mundos”. A migração é, em si, um direito universal. No decorrer da história, e ainda mais em nossos dias, o que é direito passa ser, para milhões de pessoas, a única saída de sobrevivência. Quando povos inteiros precisam se deslocar por motivos de políticas ineficientes ou fruto de uma sociedade que exclui os mais pobres, a migração já não é espontânea. Migrar se torna uma saída forçada. Há parcelas da sociedade que ainda despejam nos migrantes a culpa da desestabilização, da crise, mormente ligada às vagas de trabalho, aos costumes ou ao aumento de criminalidade. Passa-se a criminalizar os refugiados e migrantes – e isso também ocorre em Porto Alegre.
As migrações propiciaram a miscigenação de povos e continentes. Assistimos hoje a uma reconfiguração dos rostos que constituem nossos países e cidades. A identidade com a qual estávamos acostumados a descrever um povo, uma nação, vai sendo redesenhada. Nisso está uma grande riqueza. Conflitos e xenofobias são barreiras na convivência. Viver é aprender com o diferente.
A migração, que leva à partilha de bens, costumes, cultura, línguas, religião e modos diversos de viver, enriquece o tecido social de um país. Este aspecto, de acolhida e interação das diferenças, torna as sociedades multiculturais, ricas em humanidade. Pensemos nas pessoas que formam Nova York, Roma, São Paulo, Berlim – e por que não nossa Porto Alegre? Calcula-se que hoje 250 milhões de pessoas vivam fora do lugar onde nasceram. O mundo está em movimento. O mundo é migrante.
Mas não basta o país ser multicultural. É preciso que haja integração. Interculturalidade torna-se a palavra chave. Todos têm algo a dar e todos podem receber. Processo que faz e refaz a identidade de um povo e o aperfeiçoamento da humanidade.
Na celebração da semana do migrante deste ano destacam-se quatro verbos: acolher, proteger, promover e integrar. Verbos que traduzem as atitudes do bom samaritano (Lc 10, 25-37) e que na prática podem ser expressados de vários modos: orientação, informação, documentação e formação profissional, caridade, apoio. Precisamos acolher, proteger, promover e integrar para que o migrante, sendo estrangeiro, sinta-se em sua pátria, com seus direitos e seus deveres de cidadão. O bem-aventurado Scalabrini, apóstolo dos migrantes, já dizia que “para o migrante a pátria é a terra que lhe dá o pão”. Pátria é terra-mãe que acolhe e que, por sua vez, merece ser amada como a nova casa.
Em nossos dias não faltam medos, conflitos, mas, na convivência das diversidades, temos uma oportunidade para sonhar outros mundos, buscando o sonho eterno da fraternidade humana. Enquanto estamos neste mundo, somo migrantes, rumo à pátria celeste. O próprio Jesus nos dá uma oportunidade para também sermos por Ele acolhidos quando então nos disser: “Eu era estrangeiro e me acolhestes”.