O porquê do sofrimento
A 1a Leitura deste Domingo é tirada do Livro de Jó (Jó 7,1-4.6-7). É um texto que surge como um esforço para responder à pergunta persistente: por que os homens, especialmente os justos, sofrem? Jó, após perder filhos, bens e saúde, enfrenta também a perda de sua honra. Sua esposa e amigos, influenciados pela mentalidade da época, interpretam seu sofrimento como castigo por pecados ocultos.
O texto parece refletir uma visão pessimista da vida, quase à beira do desespero. Jó diz: “Se me deito, penso: quando poderei me levantar? E, ao amanhecer, espero novamente a tarde e me encho de sofrimentos até ao anoitecer.”
Jó expressa em voz alta o pensamento de muita gente. Assim como esse homem justo do Antigo Testamento, para nós também nunca é fácil enfrentar os momentos duros da vida. Surge a tentação contra a fé: será que Deus deixou de nos amar, ou, pelo menos, nos esqueceu? É uma dúvida cruel como um espinho na alma. E buscamos o como conciliar essa realidade com nossa filiação divina, com a realidade de que Deus é nosso Pai, nos ama e cuida de nós.
A oração emerge como o recurso de Jó para enfrentar o sofrimento com fortaleza. A lição permanece: diante da adversidade, Jó busca refúgio em Deus, através da oração.
Nosso Senhor Jesus Cristo, antes do momento crucial de sua vida, também se dirige ao Jardim das Oliveiras, preparando-se para as provações duras que enfrentará na Paixão, através da oração confiante em Deus.
A dor, o sofrimento, as incompreensões, as perseguições e calúnias que recebemos, humanamente falando, parecem desprovidas de sentido, de justificação. É importante lembrar que, originalmente, a dor não fazia parte dos planos de Deus, mas entrou no mundo através da porta do pecado.
Cristo morre aos 33 anos, como uma árvore cortada com frutos promissores ainda por amadurecer. Maria, sua Mãe, não é poupada ao sofrimento, e São José parte deste mundo em silêncio, consumido por uma vida surpreendentemente difícil.
Essas verdades devem nos conduzir a um ato de confiança. A permissão de Deus em relação ao nosso sofrimento não é crueldade, mas amor, algo que compreenderemos totalmente só na vida eterna.
A Liturgia deste Domingo coloca em nossos lábios um cântico de confiança e abandono nas mãos de Deus, que nunca falta nos momentos difíceis da vida, no Salmo Responsorial (Salmo 146). “Louvai a Deus, porque Ele é bom e conforta os corações.”
O sofrimento, na compreensão da fé, se revela como uma oportunidade para levar a luz do Evangelho a um mundo sofredor e desorientado. São Paulo, na 2a Leitura (1 Coríntios 9,16-19.22-23), sente essa urgência: “Ai de mim se eu não pregar o Evangelho!” A difusão da Boa Nova também ocorre em meio a grandes sacrifícios e dificuldades.
O Senhor não elimina o sofrimento, nem promete um paraíso na terra, mas nos ensina a aproveitar sua riqueza. Cristo transforma a dor em algo precioso, possibilitando a expiação de nossas faltas, a reparação das faltas alheias e uma identificação mais profunda com Ele.
Além disso, é nosso dever ajudar os que sofrem, pois a dor nos torna solidários. Sem o sofrimento, seríamos ilhas isoladas e incomunicáveis. Dediquemos um pouco do nosso tempo aos doentes, idosos e àqueles que precisam de alguém que os ouça com paciência e lhes ofereça palavras iluminadas pela fé.
Com Maria, no caminho do Calvário, aprendamos a ver no sofrimento uma riqueza que o Senhor nos oferece. O sofrimento, quando vivido com fé, torna-se uma fonte de bênçãos e transformação, guiando-nos para uma compreensão mais profunda do amor divino e também dos nossos irmãos.
Dom Antonio Carlos Rossi Keller – Bispo de Frederico Westphalen