O ‘quando’ de Deus

Estou começando este escrito com a mente envolvida no texto bíblico, tirado do Evangelho de Mateus, proposto para a leitura, meditação, oração e ação para o dia de hoje. Trata-se do texto que conclui o “Sermão da Montanha” de Jesus de Nazaré, que Ele pronunciou na encosta montanhosa nas margens do Lago de Genesaré à uma grande multidão de pessoas que vieram para escutá-lo como mestre de Israel. Ele afirma no seu sermão: “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor’, entrará no Reino dos Céus, mas o que põe em prática a vontade de Deus. Assim, quem põe em prática a vontade de Deus é como aquele que tem juízo, e, por isso, é como aquele que construiu sua casa sobre a rocha: vieram tempestades e a casa não caiu. Quem não põe em prática a vontade de Deus, é como aquele que não tem juízo, e, por isso, é como aquele que construiu sua casa sobre a areia: vieram tempestades e a casa caiu”. Os dois personagens,o com juízo e o sem juízo, são colocados à prova de modo idêntico: resiste às tempestades o construtor com juízo e sua a casa da vida construída sobre a rocha; não resiste às tempestades o construtor sem juízo e sua a casa da vida construída sobre a areia.

O mestre Jesus de Nazaré usa uma linguagem parabólica e nos ensina uma verdade pertinente para a experiência pandêmica da humanidade: quem resistirá e quem não resistirá? Nas “tempestades” próprias da pandemia, quem está resistindo e quem não está resistindo? É hora de abrir espaço à “rocha” que é Deus; é hora de fechar espaço à “areia” que é o não-Deus.

A “rocha” que é Deus tem o seu “quando” para ocupar espaço! Quando acontece esse“quando” de Deus? Especialmente o “quando” de Deus está presente nas tempestades: são nelas que Ele mostra que é “rocha” e não“areia”.

Li numa vez várias situações do “quando” de Deus presente nas tempestades da vida. Tento recordar algumas e ouso acrescentar outras.

Primeiramente nas experiências que fazemos no dia-a-dia. Assim: quando se acabam as forças, Deus as renova; quando é inevitável conter as lágrimas, Deus dá alegria; quando não há mais amor, Deus o faz nascer; quando parecer ser o final, Deus dá um novo começo; quando a aflição quer persistir, Deus nos envolve com a paz; quando a doença assola, Deus é quem cura; quando tudo parece se fechar, Deus abre uma nova porta; quando você diz: “não vou conseguir”, Deus diz: “não temas, pois estou contigo”; quando o coração é machucado por alguém, Deus é quem derrama o bálsamo curador; quando caímos num profundo abismo, Deus estende sua mão e nos tira de lá; quando tudo é dor, Deus dá o refrigério; quando o calor da provação é grande, Deus dá a sombra de sua presença; quando a noite parece não ter fim, Deus faz nascer o amanhecer; quando alguém diz que não somos nada, Deus nos diz que somos mais que vencedores.

Mas também o “quando” de Deus está presente nos ditames profundos que habitam o âmago do nosso coração. Assim: quando o sonho se desfaz, Deus reconstrói; quando a maldição é certa, Deus transforma em bênção; quando o impossível se levanta, Deus o torna possível; quando faltam palavras, Deus sabe o que queremos dizer; quando não há mais possibilidade, Deus faz o milagre; quando só há morte, Deus nos faz persistir; quando o inverno parece infinito, Deus traz o verão; quando não existe mais fé, Deus diz: “acredita”; quando falta esperança, Deus sussurra: “espere contra toda esperança”; quando estamos a um passo do inferno, Deus nos dá a direção do céu; quando não temos mais nada, Deus dá tudo.

Enfim, sintetizando o “quando” de Deus numa única forma: quando difícil se torna o caminhar, Deus nos carrega no seu colo.

Dom Jacinto Bergmann, Arcebispo de Pelotas