O Ressuscitado no cotidiano

O terceiro domingo do rico tempo pascal nos sugere esta pergunta: Onde podemos nos encontrar com o Ressuscitado? Ele está somente na missa dominical ou é presença viva e fecunda no nosso cotidiano? O texto do evangelho deste domingo (cf. Jo 21,1-19), da pesca milagrosa e do pastoreio de Pedro, faz os discípulos superarem o medo e a falta de perspectivas diante da morte do Mestre. A tentação de construir uma vida “sem Deus” continua presente nos apóstolos, como transparece neste diálogo dos mesmos: “Disse-lhes Simão Pedro: ‘Vou pescar’. Responderam-lhe eles: ‘Também nós vamos contigo’. Partiram e entraram na barca. Naquela noite, porém, nada apanharam” (Jo 21,3). Dentre as várias interpretações, uma delas é o desânimo e o desejo de voltar atrás, para o modo de vida anterior, como profissionais da pesca. Parece que haviam esquecido tudo o que tinham vivenciado com o Mestre de Nazaré nos três anos que conviveram. Recorda-nos o povo guiado por Moisés, que diante das dificuldades do deserto, murmurou e se queixou, afirmando que era melhor o passado, mesmo com o peso da escravidão do Egito (cf. Ex 16,2-4).

            Muito oportuna esta Palavra que qualifica a vida sem a presença do Ressuscitado como “noite”, em contraposição à “luz”, que é o sinônimo da fé. A vida sem Deus é escura e sem frutos. Não falo dos frutos materiais, que, muitas vezes, são até mais abundantes, mas dos frutos humanos e da alegria e paz que o Ressuscitado traz. A palavra de Jesus, no outro lado do lago diz aos apóstolos: “Vinde comer” (Jo 21,12). Não estamos órfãos e entregues à própria sorte. Alguém nos chamou à vida, não obstante todos os desafios e contradições familiares e sociais. Alguém é por nós. E isto faz toda diferença. E mais, o Ressuscitado está no cotidiano: vai onde estão os apóstolos, acompanha seus desânimos, prepara e compartilha o alimento. Esta presença do Ressuscitado dá qualidade humana e evangélica a tudo o que fazemos, promete vida plena. Uma vida sem Deus é como uma árvore envelhecida, que aparentemente está bela e frondosa, mas sua seiva vai definhando e corroendo seu interior, comprometendo seus frutos. O Ressuscitado se contrapõe à “noite”, é “luz”.

            “Portanto, assim como vocês receberam a Cristo Jesus, o Senhor, continuem a viver nele, enraizados e edificados nele, firmados na fé, como foram ensinados, transbordando de gratidão” (Cl  2,6). Por três vezes, Jesus pede a Pedro a confirmação da fé n´Ele: “Tu me amas?” (Jo 21, 15-17). É uma confiança radical na sua palavra, na vida nova de batizados, enraizados nele. Não é uma questão intelectual somente, de conhecimento de teorias, mas de amor a Jesus Cristo. Nenhum outro fundamento poderá ser posto: “Porque ninguém pode lançar outro fundamento, além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo” (1Cor 3,11).

A fé em Jesus Cristo, o Crucificado-Ressuscitado, fez daqueles humildes homens da Galiléia os grandes missionários que deram sua vida por Cristo. Ele desafia à missão: “Lançai a rede ao lado direito da barca e achareis” (Jo 21,6). De fato, os projetos pastorais são necessários, mas imprescindível que neles e além dos mesmos, não falte o testemunho de “uma vida transfigurada pela presença de Deus” (EG n. 259). A missão não é uma opção, mas está na nossa constituição enquanto cristãos, está na essência da Igreja. Lancemos as redes para transmitir a fé aos filhos, aos netos, para permear dos valores do evangelho todos os ambientes, a cultura na qual vivemos. Chegou a hora de confirmar nosso caminho de missionários de Jesus Cristo. Este Cristo Crucificado-Ressuscitado, que dá sentido para nossa vida, é o que devemos anunciar.

+ Dom Adelar Baruffi – Bispo Diocesano de Cruz Alta