Oportunidades em 2022
O ano de 2022 reserva para os brasileiros muitos desafios. Na ótica cristã compreende-se que são próprios de uma sociedade dinâmica, com muitas forças em disputa e marcada por profundas contradições. Permanece no horizonte o sonho de uma vida digna e justa para todos, sinal do Reino anunciado por Jesus Cristo. A esperança que habita o coração de cada cristão disposto a viver o compromisso de fé herdado do Batismo o faz continuar trabalhando pelo Reino, porque ali está o sentido da sua vida de fé. Diante dos desafios vale como inspiração as palavras do Papa Francisco: desafios existem para serem superados. Sejamos realistas, mas sem perder a alegria, a audácia e a dedicação cheia de esperança. Não deixemos que nos roubem a força missionária” (EG 109).
Junto aos desafios vê-se no horizonte algumas oportunidades que poderão ser benéficas para os comprometidos com uma sociedade mais justa. Diferencia-se oportunidade de oportunismo. O oportunismo não é o compromisso ético com um processo mais amplo. Enseja uma vantagem momentânea e o possível abandono do processo quando a pessoa ou grupo não o vê mais vantajoso. Oportunidade sugere a leitura dos fatos do cotidiano e a percepção de condições favoráveis para a realização de um projeto. A concretização acontecerá a partir da sensibilidade de perceber a condição favorável e a organização para fazer uso dessa condição. A oportunidade é potência. Segundo o filósofo Aristóteles potência é algo que pode vir a ser. Ainda não é. A oportunidade como potência estará conjugada ao necessário amadurecimento de um processo e à interferência de fatores internos e externos para se concretizar, tornar-se ato. Por si só a oportunidade não significa algo se efetivando. Precisa de algo mais, a sua concretização.
Serão lembradas três potencialidades no âmbito social e três no âmbito eclesial. Todavia, é cabível a percepção de outras oportunidades nos dois âmbitos citados. Isso dependerá da leitura do contexto.
Acompanhando processo cotidiano da sociedade brasileira tem se percebido uma primeira oportunidade, o fortalecimento dos diferentes grupos sociais, verdadeiramente preocupados com a construção de uma sociedade justa e fraterna. Se nos últimos anos havia preocupação com os posicionamentos fundamentalistas e belicistas e até mesmo grande insegurança sobre como agir, agora se vê como preocupação o aprofundamento do diálogo social e da solidariedade. Tornam-se canais profícuos para uma articulação entre os grupos sociais. Tal articulação sempre existiu no Brasil. Infelizmente foi negligenciada em nome de leituras equivocadas do cenário político e econômico e também, como acima citado, pelas tantas ameaças de parte de um governo insensível à dor e sofrimento do povo, que não se furtou em usar as instituições de Estado para fazer valer a sua ideologia. Viveu-se tempos de grande insegurança social. Aos poucos o cenário está mudando. As articulações estão brotando de diferentes áreas, especialmente dos grupos sociais mais vulneráveis. Desse processo poderá emergir um novo cenário social no Brasil, comprometido com a democracia e com o cuidado da vida. É uma oportunidade importante.
A segunda oportunidade está nas eleições que acontecerão no mês de outubro. Mesmo que a democracia não se reduza no ato de votar e ser votado através das eleições é possível interferir no futuro do Brasil. Faz-se necessário fugir da ingenuidade de demonizar a política. Ela é necessária e tem no processo eleitoral uma de suas expressões. Exigirá dos brasileiros a capacidade de escuta, diálogo e discernimento em vista da melhor escolha dos representantes nos poderes executivo e legislativo em nível estadual e federal. As eleições são caminho para se construir um Brasil melhor. Outra boa oportunidade.
A terceira oportunidade está na questão ambiental. Desde a publicação da Encíclica Laudato Si (2015) o Papa Francisco colocou a Igreja definitivamente como protagonista no debate ambiental. Está em jogo o futuro da nossa Casa Comum e para além de discursos bonitos ou articulações vazias, cabe a decisão pessoal e coletiva de assumir o compromisso com a preservação. É a oportunidade de frear o processo de degradação ambiental que ameaça a Casa Comum e toda a vida que habita essa casa, também a vida humana. Em consequência deixarmos esse espaço de vida em condições de ser habitado pelas gerações futuras. É o momento dessa opção. Temos a oportunidade de escolher a morte ou a vida (cf. Dt 30,19). Sejamos corajosos para escolher a vida.
Na dimensão eclesial vem desde o ano passado um debate muito alentador sobre a sinodalidade da Igreja. O Papa Francisco propôs o Sínodo para discutir esta perspectiva sob o tema: “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”. Para o Papa o Sínodo sugere muitas expectativas mas depende de cada participante e sua disposição em deixar-se iluminar pela Palavra de Deus. A Palavra abre-nos ao discernimento e ilumina-o. Guia o Sínodo, para que não seja uma convenção eclesial, um convênio de estudos ou um congresso político, para que não seja um parlamento, mas um evento de graça, um processo de cura conduzido pelo Espírito. Nestes dias, Jesus chama-nos, como fez com o homem rico do Evangelho, a esvaziar-nos, a libertar-nos daquilo que é mundano e também dos nossos fechamentos e dos nossos modelos pastorais repetitivos, a interrogar-nos sobre aquilo que Deus nos quer dizer neste tempo e sobre a direção para onde Ele nos quer conduzir (Francisco. Homilia proferida na missa de Abertura do Sínodo). O Sínodo será um momento de graça para toda a Igreja, uma grande oportunidade em vista da articulação da missão evangelizadora embasada na escuta, participação e sensibilidade aos sinais dos tempos.
A segunda oportunidade eclesial está na proposta da Campanha da Fraternidade, neste ano, começando na quarta-feira de cinzas, tratando do tema educação a partir do lema “fala com sabedoria, ensina com amor (Pr 31,26). A educação é um dos principais fundamentos da sociedade. A Igreja no Brasil está propondo a reflexão sobre esta realidade que pode ser um canal importante para a superação das desigualdades pela oferta do ensino qualificado, mas também da construção de um novo modelo de relações na sociedade.
A terceira oportunidade está na vida ordinária eclesial que perpassa nossas comunidades. É o nosso cotidiano pastoral, o chão da vida de fé da Igreja. Por ali passa a vida humana nas suas alegrias e preocupações. É também oportunidade de fazer a boa nova do evangelho se concretizar. As diferentes atividades pastorais que acontecem no seio das comunidades são oportunidades a serem aproveitadas. Que as lideranças pastorais considerem este cotidiano como oportunidade ímpar para a evangelização e cuidado pastoral. Não se perca de vista as propostas de cunho mais amplo, mas não se descuide do cotidiano. Jesus Cristo deixa-nos este princípio metodológico vivido com seriedade na sua missão. Ele fazia dos fatos do dia a dia motivos de evangelização.
O ano de 2022 apresenta grandes desafios. Apresenta também oportunidades. Saibamos aproveitá-las em vista do bem que podemos fazer, guiados pelo Espirito Santo e fundados nos nossos compromissos de fé. .
Pe. Ari Antonio dos Reis