Reconhecer a divindade do Menino Jesus…
Difundiu-se entre os pastores do vale de Beth-Sahor a notícia de que na cidade de Davi nasceu o ungido do Senhor. Todos queriam vê-lo e adorá-lo. Passados alguns dias, eis que três senhores bem vestidos apareceram para visitar o menino. Pareciam reis, nobres, envoltos em grande solenidade, com roupas decoradas e coloridas. Recebi-os ainda ao longo do caminho, em meio ao olival. Não queria expor Maria e o menino a qualquer perigo. Senti que era melhor saber com exatidão quem eram os forasteiros antes de convidá-los a entrar.
Os três nobres deixaram a caravana e, sozinhos, se aproximaram. Eram extremamente gentis.
– Shalom! –, saudaram-me desejando a paz, prova de que conheciam muito bem a nossa cultura.
– A paz esteja com vocês –, respondi gentilmente.
– Esta é a casa onde nasceu um menino vestido de luz?
Não entendi de imediato, mas por associação ao que os pastores nos haviam dito nos dias anteriores imaginei que era a Jesus que eles se referiam. Entretanto nada respondi, aguardando para compreender melhor quais eram suas intenções.
– Eu me chamo Baltasar, este é Melquior e aquele é Gaspar. Viemos de regiões longínquas, do oriente, do norte e do sul. Conhecemo-nos há anos e nos encontramos com regularidade para juntos estudar a humanidade e seu futuro, cada um a partir da própria tradição. Também nós temos livros sagrados que preveem o nascimento de um rei messias, assim como o vosso povo hebreu. Segundo nossas previsões, por este período deve nascer um rei que unificará todos os povos, unindo a todos pelo amor e fraternidade. Esse rei governará pela paz e não pela força, eliminando todo tipo de inimizade ou guerra. Ele nascerá no palácio da paz e do amor…
Tinham previsto um grande palácio, diferente da pequena estrebaria que estavam prestes a conhecer, mas a descrição do menino correspondia exatamente às características de Jesus. O palácio que viram provavelmente não era de pedra, mas de carne. Era um símbolo para descrever a beleza e grandeza espiritual de Maria. Não sei se Jesus será esse rei messias que procuram, mas é especial com certeza, porque é fruto do Espírito Santo.
Referiram que já estavam quase desanimando, pois ao longo do caminho até Jerusalém encontraram apenas indiferença e ignorância. O povo escolhido parecia desconhecer por completo o acontecimento. Quase desistiram após se reunirem com Herodes e ver que o soberano não fazia ideia do que estavam falando. E mais, o interesse de Herodes pelo nascimento do messias era sombrio, como se o visse como uma grande ameaça a eliminar. Não entendeu que era uma alegria a exaltar.
Convidei-os então a se aproximarem, convencido de que eram pessoas de bem e que cultivavam boas intenções.
– Talvez seja Jesus o menino vestido de luz que vocês estão à procura. É nosso filho!
Que alegria dizer o nome de Jesus em voz alta e confirmar que ele é nosso filho. Sim, Jesus, o menino já tinha um nome, já estava circuncidado, já fazia parte do povo eleito.
Seguiram-me por entre os animais até o mezanino onde Maria e o menino repousavam.
– Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos que ele ama! – exclamaram em coro ao ver Jesus.
Curiosamente a mesma saudação dos anjos na noite em que o menino nasceu. Diversos pastores tinham mencionado ser esse o canto que ouviram durante a noite, entoado como que por um exército de anjos. Os nobres saudaram Maria e se ajoelharam para admirar o menino que dormia serenamente. Ali permaneceram por vários minutos, contemplando o mistério sobre o qual tanto tinham estudado.
Baltasar foi o primeiro a se levantar. Abriu a bolsa que trazia e de lá tirou uma pequena urna. Era um presente para o menino, uma corrente de ouro. Cada um deles trazia uma oferta, dons para Jesus. Baltasar nos explicou o significado daquela corrente:
– O ouro é o símbolo da nobreza e da realeza. É o mais nobre dos metais. Puro, inalterável, incorruptível, precioso como deve ser um verdadeiro líder. O ouro evoca a ternura, a pureza e a luminosidade, assim como o rei deve guiar o povo com ternura e autenticidade, sempre em direção à luz, a tempos melhores.
Após acomodar o presente delicadamente ao lado da manjedoura, continuou:
– Na minha língua original, meu nome é Sahir, que significa “aquele que vai com amor”. Gostamos muito do ouro porque é o material que melhor representa o amor. É incorruptível, como o amor verdadeiro. Esse menino não é apenas rei, mas rei que se guiará pelo amor. O amor é o maior dos sentimentos, expressão da presença do Altíssimo, o Amor supremo e eterno. Deus permite que façamos a experiência do amor no mundo para nos preparar para o encontro definitivo com ele, quando experimentaremos o amor na sua forma mais pura e completa. A vida sem amor não faz sentido, por isso o menino fará tudo por amor, com amor, alicerçado no amor.
Enquanto ouvia Baltasar, reparei que Maria movimentava constantemente seu olhar, ora fixo em Jesus e ora em mim. Compreendi que com aquele olhar ela protegia o tesouro mais precioso que a vida lhe tinha presenteado. Duas pedras de ouro, cada uma com sua forma e seu espaço no coração de Maria, mas certamente ambas muito preciosas.
A seguir foi Melquior quem se aproximou da manjedoura e depositou aos pés do menino um frasco contendo pedras de incenso. Conhecíamos muito bem seu significado, pois sempre o usamos no templo para louvar o Senhor. Além do louvor e da exaltação, o incenso significa fé e alegria. Subindo suavemente ao céu, faz-nos recordar o poder da oração, diálogo fundamental entre Deus e os homens, entre Criador e criatura. Já no deserto o Senhor indicou aos nossos patriarcas Moisés e Aarão que construíssem um altar de madeira de acácia sobre o qual queimar o incenso pela manhã e pela tarde. Também o nosso pai Davi cantou ao Senhor seu louvor implorando:
– Senhor, eu te chamo, vem depressa em meu socorro.
Ouve a minha voz quando eu clamo a ti.
Suba a minha oração como incenso em tua presença,
minhas mãos elevadas como oferenda da tarde!
Melquior então continuou:
– O menino é o Verbo encarnado, é a palavra de Deus entre nós. Ele será nosso incenso, ouvirá a súplica do povo e elevará ao Pai Celeste as nossas orações.
Por um instante deixei de seguir o discurso do mago e me fixei nas palavras “Verbo encarnado”. Melquior usou a mesma expressão que tem me acompanhado durante os últimos tempos, desde a anunciação do anjo. Se Jesus é o Verbo feito carne, então ele é o comunicador perfeito. Os magos estavam nos mostrando que o simples fato de encontrar Jesus é entrar em comunicação com o divino, pois ele nos conduz à união com o Altíssimo. Aquele pensamento começou a borbulhar dentro de mim.
Quando voltei a prestar atenção em Melquior ele estava explicando a importância da oração na vida de todos os que têm fé. Concluiu dizendo que o menino será o sumo sacerdote da humanidade, o sacrifício oferecido um dia de modo definitivo. Ainda hoje não compreendo bem o que Melquior quis dizer com aquela expressão.
O ouro trazido por Baltasar significa que Jesus é rei. O incenso oferecido por Melquior significa que Jesus é sacerdote. Estava curioso para saber o que significava a mirra que Gaspar deixou ao lado da manjedoura. Mirra é usada pelo nosso povo nos funerais, para ungir os defuntos. Conhecia muito bem o pequeno arbusto espinhoso de onde se extrai a sua resina. Tantas vezes o havia encontrado quando circulava com meu pai Jacó pelos bosques da Galileia à procura de madeira de qualidade para nosso ofício. Vi sempre aquela pequena árvore cheia de espinhos como sinal de sofrimento e dor. Gaspar, porém, nos explicou que a mirra é o símbolo da imortalidade e da esperança. Comecei a pensar na vez em que minha mãe espalhou mirra sobre o corpo do seu avô recém-falecido. De fato, não era um momento de tristeza, mas de esperança em um dia lhe reencontrar.
– A mirra significa também a verdade e a humildade –, continuou Gaspar.
Nesse momento compreendi que além de rei e sacerdote, os sábios estavam afirmando que Jesus será também profeta, espalhando a esperança entre o nosso povo.
Três presentes de grande valor, tanto material como simbólico. Três dons, formas diversas de reconhecer quem é Jesus, o nosso filho. Três formas de revelar e exaltar sua identidade. Maria e eu conhecíamos a divindade do menino, pois foi Deus quem nos revelou através de seus anjos. Mas como aqueles magos poderiam saber? Teriam eles também recebido a visita de algum anjo? Não poderia perguntar isso a eles. O que importa é que os nobres fizeram uma profunda profissão de fé através de símbolos materiais. Ouro, incenso e mirra são três modos simbólicos de conjugar o Verbo encarnado, de dar voz à Palavra. Ouro para amar, incenso para louvar, mirra para esperar. Três vias para adentrar no mistério. Os magos apontavam uma estrada para quem quiser alcançar o divino. Então entendi que são muito mais que estudiosos. São sábios, porque guiam as pessoas, indicam o caminho, antecipam ao coração o que um dia talvez todos compreenderão com a mente. Através dos seus presentes anunciam que Jesus é rei, sacerdote e profeta. É caminho, verdade e vida. É o messias do povo judeu, mas também o Salvador de todos os povos, do norte, sul, oriente e ocidente.
*Trecho extraído do livro “Simplesmente José” (Paulus Editora) do fr. Darlei Zanon