Sem Deus e sem futuro
Ninguém menos do que o ilustre sociólogo Zygmunt Bauman, nos anos finais de sua vida afirmou que é impossível um futuro para a humanidade, caso desconsidere a questão de Deus. “Deus morrerá, mas a humanidade morrerá junto com ele.” Mergulhados num materialismo prático, ao abrirem mão da dimensão transcendente, os homens perdem-se a si mesmos num eterno hoje, ilusório e insuficiente para garantir qualquer sentido ou coisa que valha a pena investir afeto.
Praticamente à beira do nada, a vida vira absurdo, porque desde a modernidade o homem pôs-se no centro de tudo, como medida de tudo e para quem tudo converge. Assim nasceu o “eu”, o indivíduo que vive a partir de si e não mais da comunidade ou no encontro com o outro. O máximo que consegue alcançar em termos de intersubjetividade, afirmou-o Levinas, é implorar para que o seu semelhante –pondendo- não o destrua.
Assim chegamos a este abissal e horroroso cenário humano que observa com naturalidade a barbárie de grupos terroristas liderando os países que, pouco a pouco, deixam de constar na lista de interesses da OMC e dos que detêm o poderio econômico atual, ou seja, se não interessam mais, resolvam seus problemas. Bem demonstrou-o a postura dos Estados Unidos ao retirar as forças militares do Afeganistão, para citar apenas o último acontecimento.
O homem está no centro, afirmavam eufóricos os pensadores da liberdade exaltando as qualidades da inteligência criadora, numa ingenuidade asfixiante de quem não considera que o ser humano está sempre aquém de onde poderia (e deveria?) estar, especialmente no que se refere ao convívio, à solidariedade e ao cuidado da vida. Para tornar a imagem mais próxima, há, também entre nós, os que investem uns trocados em ações supostamente caritativas, para depois pagarem fortunas aos meios de comunicação, a fim de que os apresentem como filantropos, garantindo-lhes visibilidade e aplausos.
Neste contexto em que predomina a indiferença, a ganância, a autorreferencilidade e, no qual, boa parte das pessoas considera-se o centro em torno do qual gravita o resto do universo, à religião cabe redescobrir-se, a fim de voltar à mais elementar de suas funções: religar o homem a Deus, para que percebendo-se como ser inconstante e insuficiente possa ter sensibilidade de olhar o mundo ao seu redor e perceber que são as nossas opções e os nossos delírios de onipotência que estão tornando a vida tão complicada e manchando-a fazendo com que perca sua beleza e encanto.
Parafraseando o autor que encabeça esta crônica, “Não consigo imaginar a humanidade vivendo sem Deus.” As amostras do que somos capazes de fazer, caso esqueçamos de onde viemos e para onde vamos, já estão suficientemente dadas. Sobre a pergunta, se há algo a ser feito? Não tenho dúvidas: comecemos pela coerência de vida dos que dizemos ter fé. Sejamos mais humanos, menos prepotentes e um tanto mais abertos para além de nossas próprias comodidades e desejos. Enquanto algo pode ser feito, empenhemo-nos. Um futuro melhor nos espera, mas nele refulge e ilumina-nos a presença de um Deus amoroso e justo. Emanoel, o Deus que caminha com o seu povo.
Prof. Dr. Rogério Ferraz de Andrade