Todos irmãos – Parte I

“Fratelli tutti” (São Francisco de Assis), todos irmãos, é o título escolhido pelo Papa Francisco para sua Carta Encíclica Fratelli Tutti sobre a Fraternidade e a Amizade Social. É uma carta social, como tinha sido a LaudatoSì, de 2015. A carta, assinada no dia 03 de outubro, em Assis, quis recordar a inspiração de São Francisco de Assis para uma “fraternidade aberta”, que quer dialogar com toda a humanidade. O olhar do Papa é de uma aguda profundidade, sobretudo quando aborda as principais questões sociais atuais, a partir da fé cristã. “As páginas seguintes não pretendem resumir a doutrina sobre o amor fraterno, mas detém-se na sua dimensão universal, na sua abertura a todos” (FT, n. 6), “capazes de reagir com um novo sonho de fraternidade e amizade social que não se limite a palavras” (FT, n. 6). A Carta, de linguagem simples e direta, tem oito capítulos, com descrição e citação de vários autores e conferências episcopais pelo mundo. Merece destaque a importância dada ao Grande Imã Ahmad Al-Tayyeb, do encontro havido entre os dois, no dia 04 de fevereiro de 2019, em Abu Dhabi.

“Caminhemos na esperança” (FT, n. 55). Esta é a expressão, após a análise de vários pontos muito delicados na atualidade. “A sociedade cada vez mais globalizada torna-nos vizinhos, mas não nos faz irmãos” (FT, n. 12). É uma cultura que unifica o mundo, mas divide as pessoas e nações. Encontram-se sinais de regressão (cf. FT, n. 11), como a crescente identidade dos mais fortes, que se protegem a si mesmos e dissolver as identidades das regiões mais frágeis e pobres. As pessoas não são vistas com sua dignidade como tal, como os nascituros e os idosos. “Há regras econômicas que foram eficazes para o crescimento, mas não de igual modo para o desenvolvimento humano integral. Aumentou a riqueza, mas sem equidade, e assim nascem novas pobrezas” (FT, n. 21).

Recorda nosso Papa que “o isolamento e o fechamento em nós mesmos ou nos próprios interesses nunca serão o caminho para voltar a dar esperança e realizar uma renovação, mas é a proximidade, a cultura do encontro. O isolamento, não; a proximidade, sim. Cultura do confronto, não; cultura do encontro, sim” (FT, n. 30). A lei suprema do amor fraterno pede que sempre o cristão, pela sua fé, acolha os migrantes. Os cristãos não podem ter atitudes de fechamento e isolamento. “As migrações constituirão uma pedra angular no futuro do mundo” (FT, n. 40). Na comunicação, “aquilo que ainda há pouco tempo uma pessoa não podia dizer sem correr o risco de perder o respeito de todos, hoje pode ser pronunciado com toda a grosseria, até por algumas autoridades políticas, e ficar imune” (FT, n. 45). Enfim, caminhemos na esperança, pois Deus assim age sempre na humanidade.

Em Lc 10,25-37, a Parábola do Bom Samaritano nos convida a superar as inimizades e cuidar uns dos outros. Isto porque temos “um estranho no caminho”. Qual o personagem da parábola que nos fala mais alto? Somos provocados pela atitude do Bom Samaritano, que deu do seu tempo e seus recursos. “Somos analfabetos no acompanhar, cuidar e sustentar os mais frágeis e vulneráveis das nossas sociedades desenvolvidas” (FT, n. 64). Superemos a indiferença com este “ícone iluminador”, do Bom Samaritano. “Diante de tanta dor, à vista de tantas feridas, a única via de saída é ser como o bom samaritano” (FT, n. 67). O que sempre motiva a identidade e a missão do cristão é Jesus Cristo.

Oportunamente faremos o resumo dos outros capítulos. Vale a pena uma leitura minuciosa e profunda.

Dom Adelar Baruffi – Bispo de Cruz Alta