Uma mudança na forma de chegar a Deus

Dom Antônio Carlos Rossi Keller – Bispo de Frederico Westphalen

Servindo-se de uma parábola, no Evangelho deste domingo (Mateus 21,28-32), Jesus desfere mais um golpe contra as nossas garantias religiosas. Ele quer provocar a nossa conversão, quer que deixemos de imaginar um Deus que pensa como nós. Ele é Santo, isto é, completamente diferente do homem.

A parábola faz entrar em cena três personagens: um pai e dois filhos.

O pai mandou os dois filhos trabalharem na sua vinha. O primeiro respondeu logo com entusiasmo: “Sim, vou agora mesmo!”; o segundo, ao contrário, resmungou: “Ah! eu não tenho vontade”.

A parábola  é muito clara: o primeiro filho representa Israel, que ouviu a palavra do Senhor, respondeu ao seu chamamento e fez com Ele uma Aliança. O segundo representa os pagãos. O discurso, de qualquer modo, toma-se muito provocador: os pagãos – pensam os ouvintes – são como cães. Como pode, agora, Jesus elevar aqueles malditos à dignidade de filhos?

As surpresas, porém, não acabaram. O Mestre continua a sua história: o primeiro filho era muito bom, mas de conversa. Ele disse «Sim», mas, a seguir, não fez nada, enquanto o segundo pensou melhor, arrependeu-se da resposta negativa dada ao pai e foi trabalhar na vinha.

A reação dos judeus ao ouvirem esta parábola é de revolta contra Jesus. O povo de Israel seria então pior que os pagãos? Com certeza, responde Jesus, pois Israel fez muitas promessas, mas depois, com toda a pontualidade, não as cumpriu. Ao contrário, os pagãos, que são tidos como indignos de ter parte no Reino de Deus, entrarão no céu em primeiro lugar.

O que quer dizer para nós esta parábola? Poderíamos cair num grave erro: imaginar que nós somos o segundo filho e que, portanto, não temos outra coisa a fazer senão alegrar-nos pela nossa fidelidade e condenar a arrogância e o orgulho dos judeus. Mas não é assim. Também em nossos dias Deus continua a ter dois filhos. Na Igreja, nas nossas comunidades cristãs, no mundo, há sempre dois filhos: alguns, no Batismo, dizem sim, mas depois, na vida concreta, transformam o sim em muitos nãos. Por outro lado, há muitas pessoas que nunca disseram um sim explícito a Deus, mas, na prática de cada dia, amam o irmão, sacrificam-se pelos outros, dedicam-se às obras de caridade. Estes, embora não batizados, comportam-se como verdadeiros filhos de Deus.

Nesta altura, sentimo-nos tentados a catalogar os membros da nossa comunidade num dos dois grupos. Não façamos isso! Não vale a pena e não está certo! Até porque cada um de nós algumas vezes comporta-se como o primeiro filho e outras como o segundo.

Neste momento, com qual dos dois filhos me pareço? Com o primeiro filho que é capaz de fazer muitas coisas, mas esquece da vontade do Pai? Ou com o segundo filho que tem consciência do seu distanciamento de Deus, de ter dito não, mas, na sua fragilidade, volta para casa e faz o que o Pai lhe pediu?

Melhor seria se fôssemos como um terceiro filho, não citado na parábola: aquele que diz sim e vai mesmo! Dele não se fala na parábola, mas rezemos para que haja muitos destes em nossas comunidades. E que nós também sejamos assim.

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