Vida
A liturgia do quinto domingo da quaresma (Ezequiel 37,12-14; Salmo 129, Romanos 8,8-11; João 11,1-45) se dedica a um tema fundamental: o que é a vida? O que é a morte? Como viver? Como morrer? “Um homem que não se propõe o problema da morte e não vive o seu drama, tem necessidade urgente de ser curado”, afirma Carl Gustav Jung, psiquiatra e psicoterapeuta suíço. A Constituição Conciliar Gaudium et Spes, n. 18, diz: “Diante da morte, o enigma da condição humana atinge seu ponto alto”.
Para compreender melhor o mistério da vida e a resposta de Jesus diante da morte do amigo Lázaro, o evangelista São João usa duas palavras distintas para indicar as diferentes dimensões da realidade vida. A primeira é bem conhecida que liga ao mundo da vida dos seres vivos. Corpos formados de diversos elementos se transformam em organismos vivos. Várias ciências se debruçam sobre esta dimensão da vida para compreendê-la, cuidá-la e prolongá-la. É o fantástico mundo biológico e seus meios para se manter, renovar e multiplicar. Um verdadeiro milagre da vida que se realiza constantemente.
O homem faz parte deste mundo maravilhoso do biológico, mas não se contenta e nem se limita a ele. Abre-se a um mundo mais amplo, inclusive quer conhecer o biológico. Começa pelo conhecimento, um novo nível da vida. O homem é sempre homem, com toda a sua dignidade inviolável, mesmo que viva em coma, ainda esteja em fase embrionária. Vive a vida biológica que está aberta para todas as potencialidades. O ser humano conhece e quer conhecer tudo e sempre mais. Pergunta porque está no mundo, porque vai morrer, pergunta pelo infinito e quer sempre achar um sentido para viver.
O fato da morte de Lázaro descrito São João revela outra face fundamental da vida: os relacionamentos de amizade e amor. As reações de Jesus quando se reencontra com Lázaro, Marta e Maria são próprias de uma situação de sofrimento advindos da morte de um ente querido: choro, perguntas, incertezas, manifestação de fé e esperança. Jesus é questionado por Marta por que não veio antes para evitar a morte de Lázaro. Responde: “Esta doença não leva à morte”. Marta deseja a imortalidade biológica. Podemos imaginar o que aconteceria se a vida biológica não tivesse fim, se fosse imortal. Viveríamos num mundo envelhecido, num mundo sem espaço para os jovens, sem renovação da vida. Deste modo, compreendemos que não é este tipo de imortalidade ao qual aspiramos.
Na medida em que se desenvolve o encontro com a família enlutada de Lázaro e as outras pessoas presentes, Jesus vai aprofundando a compreensão da vida e da morte. Não é possível esperar um prolongamento infinito da vida biológica, mas isto não apaga a sede de eternidade. Jesus intervém e diz: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra viverá. E todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá jamais. Crês isto? Respondeu ela: “Sim, Senhor” eu creio firmemente que tu és o Messias”.
Durante a vivência neste mundo somos convidados a entrar em comunhão com Deus que é eterno, a fonte da vida eterna. Encontrando com Cristo entramos em contato com a eternidade para além da vida biológica. Nesta busca, todas as dimensões da vida humana se encontram e os mistérios da vida vão se revelando. Jesus disse: “Eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância” (Jo 10,10), não significa apenas abundância de coisas para consumir e realizar todos os desejos de bens materiais. A abundância se refere a todas as dimensões da vida humana. Significa estar em comunhão com a vida verdadeira e eterna, que é o próprio Deus, tornando cada vida humana portadora de vida para os outros.
Dom Rodolfo Luís Weber – Arcebispo de Passo Fundo