Aborto: assista ao vídeo com o pronunciamento de Dom Ricardo

Na manhã de segunda-feira (6), Dom Ricardo Hoepers, bispo de Rio Grande/RS, e padre José Eduardo de Oliveira, da Diocese de Osasco, representaram a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) em audiência pública que discute a descriminalização do aborto no Brasil.

Assista ao vídeo com Dom Ricardo e o padre José Eduardo de Oliveira aqui.

Abaixo, a íntegra dos discursos:


PELA VIDA, CONTRA O ABORTO

“Não matarás, mediante o aborto, o fruto do seu seio”

(Didaquê, século I)

Exma. Sra. Ministra Carmen Lúcia, Presidente deste Supremo Tribunal Federal, Exma. Sra. Ministra Rosa Weber, relatora da ADPF 442, Sres. Ministros, Senhoras e Senhores,

  1. Razões de ordem ética, moral e religiosa

Eu quero iniciar com um ato de agradecimento à Sra. Exma. Ministra Rosa Weber, que no primeiro dia dessa Audiência a Sra. reconheceu que: “trata-se de um tema jurídico delicado, sensível, altamente polêmico enquanto envolvem razões de ordem ética, moral e religiosa”. Diante disso é estranho, mas querem nos desqualificar como fanáticos e fundamentalistas religiosos impondo sobre Estado Laico uma visão religiosa.

Por isso, a “Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB, reitera sua posição em defesa da vida humana com toda a sua INTEGRALIDADE (dado científico), DIGNIDADE (Art. 1º da Const.) e INVIOLABILIDADE (Art. 5º da Const.), desde a sua concepção até a morte natural” (Nota CNBB, 11/04/2017).

Isso é o mínimo de razoabilidade aceitável que nos permite estar aqui para discutirmos este tema com a recta ratio.

  1. Considerar os reais sujeitos a serem tutelados

Não podemos tratar o assunto negando, deletando, ignorando a existência do bebê. Parece que estamos falando de uma vesícula biliar, de um rim, ou um adendo que precisamos extirpar, que está causando a morte das mulheres. O foco está errado!!! Se é um problema de saúde publica, deve ser tratado e solucionado como tal. Mas não foram poucas vezes que ouvi nesta Audiência a ideia de que é necessário que a mulher supere e transcenda a imposição do papel materno. A ideia do desengravidar as mulheres… isso Exma. Ministra, não tem nada a ver com os artigos 124 e 126 do Código Penal.

Mas a questão jurídica dos números 124 e 126 do Código Penal foi recepcionada sim, por todas as mães que, pensaram em abortar, mas não o fizeram lembrando que é um atentado contra a vida. Se negarmos isso, negaremos a capacidade de discernimento de todas as mulheres que optaram por não abortar para salvaguardar seus filhos. O desacordo não é jurídico. Desabilitando os já referidos números do código penal, este STF estaria desacreditando na consciência reta que tutela a vida mais frágil e inocente que é a do bebê.

O problema que ninguém quer nominar esse inocente. Ele foi apagado, deletado dos nossos discursos para justificar esse intento em nome da autonomia e liberdade da mulher. Mas, a criança em desenvolvimento na 12º semana é uma pessoa, uma existência, um indivíduo real, único e irrepetível e, provavelmente, neste momento, a mãe já escolheu um nome para seu filho.

Nós, brasileiros e brasileiras vamos esperar ansiosamente essa resposta da Suprema Corte: afinal, atentar contra a vida de um ser humano inocente é crime ou não?

Se a questão é de saúde, (Salus – salvar), a lei teria que proteger a mãe e o filho proporcionalmente. Como este STF vai explicar a permissão da pena capital a um ser humano inocente e indefeso para justificar nossa incapacidade de políticas publicas de proteção à sua saúde reprodutiva da mulher?

É assim que o Supremo Tribunal Federal vai garantir a inviolabilidade do direito à vida? Dando uma arma chamada “autonomia” para que homens e mulheres ao seu bel prazer interrompam a vida das crianças até a 12º semana sem precisar dar nenhuma satisfação de seu ato predatório? Esperamos que não, pois,

“O direito à vida é o mais fundamental dos direitos e, por isso, mais do que qualquer outro, deve ser protegido. Ele é um direito intrínseco à condição humana e não uma concessão do Estado. Os Poderes da República têm obrigação de garanti-lo e defendê-lo.

“Não compete a nenhuma autoridade pública reconhecer seletivamente o direito à vida, assegurando-o a alguns e negando-o a outros. Essa discriminação é iníqua e excludente. (Nota CNBB, 11/04/2017).

  1. Propostas alternativas

Então poderíamos nos perguntar: o que fazer?

Urge combater as causas do aborto, através da implementação e do aprimoramento de políticas públicas que atendam eficazmente as mulheres, nos campos da saúde, segurança, educação sexual, entre outros, especialmente nas localidades mais pobres do Brasil” (Nota da CNBB 17/04/2017), e isto não é matéria para ser discutida nesta Suprema Corte e, sim no Legislativo.

Mas, em todo caso, eu convido a Sra., Exma. Ministra Rosa Weber, que antes de tomar sua decisão, conheça pessoalmente ao menos uma, das casas Pró-vida que começam a se espalhar pelo Brasil. Nelas, a Sra. não vai encontrar só mulheres que recepcionaram os números 124 e 126 do Código Penal, não atentando contra a vida inocente, mas também encontrará os filhos que elas não abortaram dizendo: “obrigado porque me deixaram viver!!!”.

A Sra. poderá mostrar ao mundo que nenhuma sociedade democrática está condenada e obrigada a legalizar o aborto por pressões externas. Poderá mostrar que nosso país não se rebaixa para interesses estrangeiros sobre nossa soberania.

Nós também somos capazes de construir projetos sociais alternativos para ajudar as mães a gerar e cuidarem de seus filhos. Essas iniciativas já estão demonstrando que é muito mais eficaz, menos oneroso ao Estado e altamente salutar às mães (mulher), salvaguardar a criança (nascituro), do que dar a essas mulheres mais um trauma e um drama pelo resto de suas vidas. É uma pena que o Estado e muitas Instituições ficaram tão obcecados e limitados com a estreita visão do aborto e da sua legalização que, se pensássemos o uso dessas verbas para projetos alternativos de cuidado e acompanhamento das casas de acolhida, hoje estaríamos com uma visão diferenciada.

Cito apenas algumas delas:

  1. Casa Pró-vida Mãe Imaculada (Curitiba – PR)
  2. Casa Luz (Fortaleza – CE)
  3. Casa mater Rainha da Paz (Canoinhas – SC)
  4. Associação Guadalupe (São José dos Campos – SP)
  5. Casa da Gestante Pró-Vida S Frei Galvão (Nilópolis – RJ)
  6. Pró-Vida de Anápolis (Anápolis – GO)
  7. Comunidade Santos Inocentes (Brasília – DF)

Estamos aqui, porque fazemos parte da maioria dos brasileiros que são movidos pela fé em Deus, mas também pelo cuidado e defesa da vida. Por essa fé, não medimos esforços nos gestos de verdadeira solidariedade, de justiça e de fraternidade.

Tem algo que Deus nos deu e ninguém pode nos roubar que é a esperança. Nossas comunidades, lá nas periferias do nosso país conhecem muito bem quem são as mulheres pobres, negras, sofridas… O que fazemos é mostrar outras saídas, outras alternativas para as mães desesperadas. São milhares de voluntários que, nas diversas pastorais, (gostaria de lembrar de quantas crianças nesse país Pastoral da Criança já salvou) acolhem, atendem, amam o que fazem e, isso não é fundamentalismo religioso, mas o fundamento da VIDA que é o AMOR, e quem ama cuida até o fim.

Pedimos, como CNBB, que esta Suprema Corte não permita a descriminalização do atentado contra a vida nascente.

O nome de muitas mulheres que infelizmente morreram por causa do aborto, aqui, foram lembrados… são perdas irreparáveis. Mas, nesse momento, a minha homenagem é para as crianças que morreram com suas mães, e que não sabemos seus nomes, mas com certeza, suas mães já o sabiam…

Essas crianças anônimas que a sociedade não tem a coragem de nominá-las e as esconde nos seus discursos e retóricas como se não existissem…ELAS EXISTIRAM E EXISTEM, nenhuma sã consciência pode negar isso.

Exma. Ministra Rosa Weber, um dia o grito silencioso desses inocentes calará fundo, pois a nossa nação, Pátria amada, mãe gentil, sentirá falta da alegria e do sorriso desses filhos que ela não deixou nascer. Permita-nos continuar cantando: “Dos filhos deste solo, és mãe gentil, Pátria amada Brasil”

Dom Ricardo Hoepers – Bispo do Rio Grande – RS

Expositor habilitado


Acerca do aborto, a CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL
pronunciou-se de maneira absolutamente inequívoca por diversas ocasiões, reiterando

“sua posição em defesa da integralidade, inviolabilidade e
dignidade da vida humana, desde a sua concepção até a
morte natural”

e condenando, assim,

“todas e quaisquer iniciativas que pretendam legalizar o
aborto no Brasil”.

Pela limitação do tempo, quero fazer apenas quatro breves colocações em meu
pronunciamento.

Primeira colocação.

Esta audiência não se presta para o fim a que foi convocada. Presta-se apenas
para legitimar o ativismo desta Corte. Está-se fingindo ouvir as partes, mas na
realidade está-se apenas legitimando o ativismo que virá em seguida. A prova é que
os que defendem o reconhecimento do aborto como direito tiveram bem mais do que
o dobro do tempo e bem mais do que o dobro de representantes dos que defendem a
posição contrária. Isto não respeita o princípio do contraditório que está expresso na
Constituição. O artigo quinto inciso 55 da Magna Carta estabelece que aos litigantes
em processo judicial ou administrativo são assegurados o contraditório, – a igualdade
das partes no processo -, e ampla defesa. Esta audiência, ao contrário, é parcial. A
própria maneira pela qual esta audiência pública está sendo conduzida viola a
Constituição Federal.

Segunda colocação.

A ADPF 442 sequer deveria estar sendo processada. Deveria ter sido
indeferida de plano e imediatamente. A petição inicial é inepta porque a Lei 9882/99,
que é a lei que rege as ADPFs, estabelece como requisito essencial para o
processamento que a petição inicial venha instruída por controvérsia.

O artigo primeiro da Lei 9882 estabelece que

“caberá argüição de descumprimento de preceito
fundamental quando for relevante o fundamento da
controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo”.

O artigo terceiro estabelece que

“a petição inicial deverá conter a comprovação de existência
de controvérsia relevante sobre a aplicação do preceito
fundamental que se considera violado”.

Ora, é fato evidente que desde 1988 nunca houve controvérsia sobre a
constitucionalidade da norma impugnada. A controvérsia foi artificialmente fabricada
no voto do Habeas Corpus 124.306 redigido pelo Ministro Barroso, ex advogado de
organizações que defendem a despenalização do aborto. Até o voto não havia, em
qualquer obra de direito constitucional ou penal, nenhum registro de suspeita de
inconstitucionalidade da norma.

Terceira colocação.

O Supremo Tribunal Federal não pode legislar. Mas no nosso caso já não
estamos nem mais falando de legislar, mas de usurpar o Poder Constituinte
Originário. O artigo quinto da Constituição estabelece que a inviolabilidade do direito
à vida é cláusula pétrea, e seu parágrafo segundo estabelece que os direitos e garantias
expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
por ela adotados, ou seja, proíbe qualquer interpretação restritiva dos direitos
consignados neste artigo, inclusive o direito à vida. A únicas restrições ao direito à
vida são aquelas estabelecidas no próprio texto da Constituição. Portanto, nem o
Congresso poderia diminuir estes direitos. Muito menos o Supremo Tribunal Federal.

Por estes motivos, tanto esta audiência pública, quanto este processo não são
legítimos.

Quarta colocação.

A Comissão Episcopal da Pastoral Familiar da CNBB, em artigo publicado na
última sexta feira analisou os discordantes números aqui apresentados sobre as
estatísticas do aborto. Estes números acabaram se tornando a base de quase todas as
apresentações da audiência da sexta feira. Dezenas de representantes de organizações
falaram de um milhão de abortos por ano e de quinhentos mil abortos por ano.
A professora Débora Diniz disse explicitamente que o número anual de
abortos calculados no Brasil é de 503 mil por ano. Disse também que as pesquisas
constataram que metade destes abortos passam por internações na rede hospitalar. Isto
daria cerca de 250 mil internações, o que conferiria com os dados do SUS.
Ora, os dados do SUS são que há 200.000 internações por aborto por ano. A
estimativa dos médicos experientes é que destes, no máximo 25% seriam por abortos
provocados. Numerosas pesquisas apontam valores entre 12% e 25%. Em 2013 o
IBGE estimou que o número de abortos naturais corresponde a 7 vezes o número de
provocados.

Tomando o valor mais conservador de 25%, deveríamos concluir que se
houvesse no Brasil 250 mil internações por abortos provocados, deveria haver entre
um milhão e um milhão e meio de internações totais de abortos, e não apenas 200 mil.
Além disso, os livros de obstetrícia e patologia afirmam que o número de
abortos naturais, ocorridos em sua maioria no final do primeiro trimestre, é cerca de
10% do números de gestações, a maioria dos quais passam pelo SUS. Se as
internações por abortos fossem um milhão ou um milhão e meio, o número de
nascimentos no Brasil deveria ser 10 vezes maior. Nasceriam no Brasil entre 10 a 15
milhões de crianças por ano. Mas só nascem 2.800.000.

A realidade é que dos 200 mil abortos atendidos pelo SUS, no máximo 50 mil
são abortos provocados. Provavelmente bem menos. Então no máximo há 100 mil
abortos provocados por ano no Brasil. Os números que foram aqui apresentados são
10 ou mais vezes maiores do que a realidade. Toda esta inflação é para poder concluir
que onde se legalizou a prática, realizam-se menos abortos do que no Brasil.

Mas na Alemanha se praticam 120.000 abortos por ano. A Alemanha possui
apenas 80 milhões de habitantes. Se a Alemanha tivesse 200 milhões como o Brasil,
ali haveria 300 mil abortos por ano, três vezes os do Brasil.

Na Espanha se praticam 100 mil abortos por ano. A Espanha tem apenas 45
milhões de habitantes. Se possuísse duzentos milhões, ali se praticariam 400 mil
abortos por ano, quatro vezes mais que o Brasil.

Os Estados Unidos tem 320 milhões habitantes, e 900 mil abortos por ano. Se
tivessem 200 milhões de habitantes, praticariam 600 mil abortos por ano, seis vezes o
Brasil.

O Reino Unido tem 60 milhões de habitantes e 200 mil abortos por ano. Se
tivesse 200 milhões de habitantes, praticaria 700 mil abortos por ano, sete vezes o
número do Brasil.

A Suécia tem 10 milhões de habitantes e pratica 40 mil abortos por ano. Se
tivesse 200 milhões de habitantes, praticaria 800 mil abortos, oito vezes mais que o
Brasil.

A Romênia, de que tanto se falou aqui, possui 20 milhões habitantes e pratica
90 mil abortos por ano. Se tivesse 200 milhões, faria 900 mil abortos por ano, nove
vezes os do Brasil.

A China, com 1 bilhão e 300 milhões de habitantes e sete milhões e 400 mil
abortos. Se tivesse a população do Brasil, faria um milhão e duzentos mil abortos por
ano, mas isto é doze vezes o número do Brasil.

A Rússia possui 140 milhões de habitantes e um milhão e meio de abortos por
ano. Isto é 23 vezes mais do que no Brasil.

Em todos estes países o aborto foi legalizado. Praticam entre três a 23 vezes
mais abortos que o Brasil. Se examinarmos as estatísticas de outros países de que
temos dados confiáveis e onde o aborto está legalizado, como Georgia, Casaquistão,
Cuba, Estonia, Hungria, Ucrania, Islândia, Dinamarca, Noruega, Turcomenistão,
Nova Zelândia, Coréia do Sul, França, Israel, Grécia, Portugal, Finlândia, África do
Sul, Bélgica, Lituânia, Japão, Itália, Taiwan, Suiça, Uzbequistão, Canadá, Austrália,
Holanda e outros, obteremos dados em tudo semelhantes.

A conclusão é que, exatamente ao contrário do que foi sustentado aqui pelos
que estão interessados em promover o aborto, quando se legaliza o aborto o número
de abortos aumenta, e não diminui. É no primeiro mundo onde se praticam mais
abortos, e não no Brasil.

Por favor, não mintam para o povo brasileiro. Nós somos uma democracia.

Como disse o Ministro Barroso, democracia não é somente voto.