Michelle Girardi: “Precisamos de músicos dedicados, que possam contribuir, mas que estejam dispostos a caminhar em comunidade, e não sozinhos”
Michelle Arype Girardi Lorenzetti, doutoranda em Música pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), cristã católica, residente em Porto Alegre, embarca, no dia 20 de setembro de 2017, para complementar pesquisa em música na Alemanha. A viagem de estudo tem por objetivo de reforça e enriquecer a formação voltada para a prática litúrgico musical a partir de quatro colaboradores da música da Igreja do Brasil: Irmã Míria Terezinha Kolling, Padre José Henrique Weber, Padre Ney Brasil Pereira e Irmã Custódia Cardozo. Michelle, enquanto preparava para partir, concedeu entrevista à assessoria de imprensa do Regional Sul 3 da CNBB e fala sobre sua trajetória com a música e expectativa na Alemanha. Confira entrevista:
Fale um pouco de você, sua trajetória na Igreja, gosto pela música.
Eu comecei a participar da Igreja por incentivo dos meus pais. Entrei para o grupo de jovens pelos 14 anos. Eu ficava ouvindo os jovens tocarem e cantarem na Missa e dizia que este era meu sonho. Eram muitos violões e a alegria deles me cativava. Logo fiz a Crisma e ingressei para o Curso de Liderança Juvenil (CLJ) na Paróquia São João Batista. O meu envolvimento com a música se deu inicialmente na escola. Lá comecei a participar de um Grupo Vocal. Quando me envolvi com o grupo de jovens, comecei a cantar, mas na época eu era muito tímida.
Por que optou pela formação em Música?
Eu fiz 5 semestres de Psicologia antes de fazer a faculdade de Música. Eu queria muito ser psicóloga, mas, com o passar do tempo, fui cada vez mais me envolvendo com coral, aulas de canto, aulas de teoria musical, apresentações. Até que chegou um momento que tive que optar. Eu não me imaginava trabalhando com outra coisa que não a música. Mesmo assim, eu tinha muito medo de viver de música, afinal, são muitos preconceitos existentes com a profissão de músico. Porém, decidi investir e, meu primeiro drama foi ter que passar pela prova específica da UFRGS. Passei de primeira. Fiz o Bacharelado em Música – Habilitação Canto e a Licenciatura em Música.
Qual foi o víeis de sua dissertação de mestrado?
Juntamente com a formação acadêmica, comecei a dar aulas de música em escolas de educação básica, paróquias, escolas de música, e até mesmo nas casas dos alunos. Nesses anos eu segui meu envolvimento com a Igreja, participando de diversas formações sobre música litúrgica (CELMU, Pós em Música Ritual). Já no meu trabalho de conclusão de curso da Licenciatura eu percebi que aquilo que eu fazia como professora de música na Igreja precisava ser registrado. É claro que isso não veio do nada! Isso foi fruto de muitas reflexões sobre os registros que eu fiz na cadeira de estágio e sobre como as pessoas aprendiam música na Igreja. No meu TCC analisei experiências pedagógico-musicais realizadas de 2010 a 2012 em dois grupos da Igreja Católica. Um deles era um grupo de jovens de 13 a 18 anos. O outro grupo era de pessoas acima de 50 anos. Decidi seguir estudando esse tema no mestrado e fiz a seleção para o Programa de Pós-Graduação em Música da UFRGS. Ingressei no mestrado sob orientação da professora Jusamara Souza, na subárea de Educação Musical. Logo envolvi-me com o Grupo de Pesquisa Educação Musical e Cotidiano. Ali percebi que minha pesquisa tinha espaço se eu realmente a embasasse teoricamente e metodologicamente. No grupo de pesquisa fui encontrando os autores e livros que poderiam me auxiliar nessa tarefa. Assim, em 2015 concluí minha dissertação intitulada: Aprender e ensinar música na Igreja Católica: um estudo de caso em Porto Alegre/RS[1]. Na dissertação investiguei as relações educativo-musicais no Vicariato de POA. Fiz um levantamento inicial de 240 pessoas envolvidas com música no Vicariato, das quais realizei entrevista com doze que atuavam como professores e/ou formadores de música. Foram destacados aspectos sobre as formas de aprender música na Igreja, sobre concepções do ser músico na Igreja, profissional e voluntário, entre outros.
E no doutorado, qual a principal tese?
Em 2015 ingressei no doutorado em Música na UFRGS e segui sob orientação da Profª Drª Jusamara Souza. Em minha pesquisa compreendo a Igreja como instância formativa a partir da formação musical de religiosos que possuem um relevante papel na história litúrgico-musical no Brasil. Com minha pesquisa busco compreender o processo de formação musical de quatro religiosos, a partir da abordagem da História Oral. Dois critérios foram estabelecidos na definição dos entrevistados: estar atuando na formação musical e ter a formação voltada para a prática litúrgico musical. A partir destes critérios foram escolhidos quatro colaboradores: Irmã Míria Terezinha Kolling, Padre José Henrique Weber, Padre Ney Brasil Pereira e Irmã Custódia Cardozo.
Como a Universidade Federal acolheu o víeis de sua pesquisa?
Com a experiência na Igreja e com os estudos logo percebi que a igreja era um espaço de muita atividade musical e que eram necessárias pesquisas. Isso interessava a mim enquanto formadora, como profissional que atuava neste contexto e passou a interessar-me como pesquisadora. Percebi que isso era interesse da área da Música, mais especificamente da Educação Musical também. Muitos alunos procuram o ensino superior após terem tidos experiências musicais nas religiões e isso ainda precisa ser mais investigado. Em nenhum momento senti-me desrespeitada por minha pesquisa, pelo contrário, nos diversos congressos que participei via o interesse pelo tema e a curiosidade com os resultados. Eu fui percebendo a necessidade de muitas leituras para poder fazer um trabalho que realmente contribuísse com o meio acadêmico e com aqueles que atuam com música nas igrejas.
Como a Universidade Federal acolheu o víeis de sua pesquisa?
Penso que a experiência que terei na Alemanha reforça e demonstra o respeito por minha pesquisa. Após diversas etapas (seleção dentro do meu programa de Pós, seleção na UFRGS, seleção na CAPES), fui aceita no Programa de Doutorado-sanduíche no Exterior – Edital 19/2016 da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior). Estou viajando com uma bolsa de 4 meses pela CAPES/ Brasil. Eu já vinha percebendo que eu necessitaria aprofundar meus estudos de alemão para enriquecer minha revisão bibliográfica. Além disso, o alemão foi minha outra opção de língua para ingresso no doutorado (além do inglês). Ao ir estudando o alemão, fui me deparando com diversos livros e artigos e percebi que estar na Alemanha iria contribuir muito com meu trabalho. A formação de músicos da Igreja é levada muito a sério na Alemanha. Em um Congresso, fui apresentada por minha orientadora a um professor alemão que se interessou em ter alunos brasileiros em seu grupo de pesquisa. Lá terei a oportunidade de aprofundar o conhecimento metodológico também. Embarco dia 20/setembro e permanecerei até fevereiro.
Uma mensagem final aos que desejam trilhar pela música cristã católica.
Estou podendo entrar em contato com diversas histórias sobre a formação musical na Igreja. Cada vez mais vejo a riqueza de estudarmos aquilo que já passamos para compreender melhor o que vivemos hoje. Para aqueles que desejam aprofundar sobre o assunto, sugiro que realmente estudem. Precisamos de músicos dedicados, que possam contribuir, mas que estejam dispostos a caminhar em comunidade, e não sozinhos. Hoje já temos diversos materiais para nos auxiliar. Recentemente lançamos pela Missão Tabor[2] uma série de vídeos no Youtube sobre “Formação Litúrgico-musical”[3].
Entrevista concedida ao jornalista Judinei Vanzeto – Assessoria de imprensa do Regional Sul 3 da CNBB.
Confira sugestões:
[1] O TCC e a dissertação estão disponíveis no Lume da UFRGS: http://hdl.handle.net/10183/71576 ou http://hdl.handle.net/10183/114671
[2] Site: http://www.missaotabor.com.br/
[3] Vídeo no Youtube – Série Formação Litúrgico-musical: https://youtu.be/RsiMKrgok7w