Amparo Afetivo

 

“[…] compreender e ser compreendido é essencial, não só para solucionar os conflitos internos e externos, mas para tornar-se mais humano.” (Nichols)

“Ninguém me entende!” Quem de nós já não ouviu os adolescentes manifestando essa queixa? Em outra leitura poderíamos dizer que, em alguma medida, o grito é por entender-se. Que vivemos numa sociedade complexa não é novidade para ninguém. O que, por vezes, esquecemos é que travamos relacionamentos complexos, que exigem mais do que respostas rasteiras ou simplificadas quando se trata do diálogo entre as gerações.

Segundo Lipovetsky, atualmente, o que há de mais frágil no mundo é a personalidade. Em torno disso, muitos estudiosos procuram caminhos que ajudem na hercúlea tarefa de acompanhar e proteger afetivamente crianças, adolescentes e jovens diante de tantos conflitos e angústias concernentes à idade, mas também aos dilemas do mundo moderno, que se multiplicam a cada dia.

Nós, educadores, acompanhamos com assombro o abandono de muitos estudantes, que não têm a quem recorrer quando se sentem ‘sozinhos no mundo’ e não sabem qual direção tomar. Em nossas escolas reverberam os sofrimentos e as mazelas de uma sociedade que parece tranquilizada ao entregar as novas gerações às redes sociais. Sentimo-nos cômodos por ver a criança bem ao nosso lado fisicamente, mas não temos ideia do que se passa no interior dessa pessoa que, por vezes, abriga um imenso vazio, sem conseguir expressar que apenas ‘sobrevive’ em um mundo mergulhado em incertezas, sem entender o que se passa consigo mesma e com a realidade ao seu redor.

Pesquisadores, nos Estados Unidos, descobriram que ouvir as batidas do coração da mãe ajuda a diminuir a mortalidade infantil dos bebês prematuros. Assim, são gravados os batimentos cardíacos e postos para que os pequeninos ouçam, otimizando a superação de quem está apenas entrando na vida. A conclusão é que “Escutar cura”, é medicinal. É doloroso perceber a carência de tantos jovens e crianças, que se sentem desamparados afetivamente, por não terem quem os escute. E nós, adultos, atarefados e sem tempo, minimizamos o sofrimento oculto, que muitas vezes só é descoberto em situações extremas.

Se há um trabalho importante a ser realizado, bem mais significativo do que ficar inventando teorias e especulando sobre as condições de trabalho nos próximos anos, é a decisiva – e tão simples – tarefa de sentar com os filhos e conversar com eles. Tal qual aquela vez, há muito tempo ocorrida, que minha mãe sentou ao meu lado perguntando o que havia comigo e por que eu andava triste? Bendito dia! Tive a felicidade, anos depois, de sentar ao lado dela – quando tomada pelo Alzheimer já não entendia mais nada –  e segurar sua mão com emoção, retribuindo o amor que me dispensara durante toda a vida. Se não ouvirmos os jovens hoje, teremos como certo um futuro de solidão sem ninguém que nos ouça. Nosso próprio futuro está em nossas mãos. Já é tempo!

 

Prof. Dr. Rogério Ferraz de Andrade – Secretário Executivo da CNBB Sul 3