Fátima

Dom Jaime Spengler – Arcebispo metropolitano de Porto Alegre

Há cem anos teve início um evento que marcou a história recente da Igreja. Em 1917, três pastores – três crianças – se tornaram mensageiros de uma revelação privada, por meio da qual se pedia oração e reparação como caminho para a paz.

Em Fátima se dá uma revelação privada. Como compreender o que seja uma revelação privada? Diz o Catecismo da Igreja Católica: “No decurso dos séculos, houve revelações denominadas ‘privadas’, algumas delas reconhecidas pela autoridade da Igreja. Elas não pertencem, contudo, ao depósito da fé. A função delas não é ‘melhorar’ nem ‘completar’ a Revelação definitiva de Cristo, mas ajudar a viver dela, com mais plenitude, em determinada época da história. Guiado pelo Magistério da Igreja, o senso dos fiéis sabe discernir e acolher o que nessas revelações constitui um apelo autêntico de Cristo ou de seus santos à Igreja. A fé cristã não pode aceitar ‘revelações’ que pretendam ultrapassar ou corrigir a Revelação da qual Cristo é a perfeição” (n.67).

Revelações privadas reconhecidas pela Igreja não exigem adesão do fiel. Não são normativas. Elas podem, contudo, guiar e orientar o comportamento de batizados para assumirem com maior determinação a proposta do Evangelho do Crucificado-Ressuscitado. Nesse sentido, pode-se afirmar que uma revelação privada pode representar um auxílio para a fé e manifesta-se credível porque faz um apelo à revelação pública.

A aprovação de uma revelação privada pressupõe três elementos: “que a respectiva mensagem não contém nada em contraste com a fé e os bons costumes, que é lícito torná-la pública, e que os fiéis ficam autorizados a prestar-lhe de forma prudente a sua adesão”.

A mensagem de Fátima apresenta uma vigorosa exortação à oração como caminho para a “salvação das almas” e, ao mesmo tempo, um forte apelo à penitência e à conversão. Trata-se, portanto, de uma exortação a confiar na promessa que o próprio Jesus apresenta no Evangelho: “No mundo tereis aflições, mas tende confiança! Eu venci o mundo” (Jo 16, 33).

Nas aparições de Fátima, Nossa Senhora pede oração pelos que mais precisarem. Ela é mãe solícita de todos os necessitados. E são tantos os necessitados de nosso tempo: há tantos deserdados e infelizes dos quais foi roubado o presente; há uma multidão de excluídos e abandonados a quem é negado o futuro; e o que dizer dos órfãos e injustiçados a quem não se permite ter um passado?

A pergunta de Nossa Senhora aos pastorzinhos continua repercutindo no tempo atual: “Quereis oferecer-vos a Deus?”. Tal questão provavelmente encontra pouco eco numa sociedade líquida como a atual. No entanto, há sempre um pequeno resto que espera e confia.

A mensagem de Fátima é uma recordação de que o ser humano de boa vontade possui uma mãe. E ela adverte para o risco de uma vida que não considera Deus e que profana-O nas criaturas. Ele, o ser humano, foi criado como uma esperança para seus semelhantes, realizável por meio do estado de vida que cada um abraça.

No último dia 13 de maio, em Porto Alegre, foi inaugurado o novo Santuário de Fátima. Trata-se de um templo sagrado, onde quem a ele acorre poderá derramar o coração diante do Senhor. Naquela bela construção todos são recordados de que o Filho de Maria se faz presente onde a comunidade se reúne para escutar a Palavra Sagrada e para repartir o Pão da Eucaristia, cientes de ser, pelo batismo, “sal da terra e luz do mundo”.

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